sexta-feira, 26 de agosto de 2011

El-Rey-Menino

Escrito por António Nobre 






Anda tudo tão triste em Portugal! 
Que é dos sonhos de glória e ambição? 
Quantas flores do nosso laranjal 
Eu irei ver cahidas pelo chão! 

Meus irmãos Portuguezes, fazeis mal 
Em ter ainda no peito um coração. 
Talvez só eu! (Amôr ai tu m'entendes!) 
Possa ainda ter a paz que já não tendes. 

Talvez só eu irmãos! mas é que a mim 
Deve o Senhor as flores com que s´enfeita 
A mocidade!... que é d'elle o meu jardim! 
Dizei-me vós irmãos, na vida estreita 
Toda a desgraça não terá um fim? 
Se a ventura não pode ser perfeita 
Tenho agora a Pátria em sepultura! 
Que mais quereis da taça d'amargura? 

Virá, um dia, carregado de oiros, 
Marfins e pratas que do céu herdou, 
O Rei menino que se foi aos moiros, 
Que foi aos moiros e ainda não voltou. 

Tem olhos verdes e cabellos loiros, 
Ah não se enganem, (e ainda não chegou) 
Virá El-Rey-Menino do Estrangeiro, 
N'uma certa manhã de nevoeiro...
Tem loiros os cabelos, e é criança, 
Tem olhos verdes de luar nocturno:

Olhos verdes, são olhos de esperança! 
Olhos verdes, são luas de Saturno! 
Veio da África mais a sua lança 
Vae p'lomundo, rezando taciturno. 
Tão pobrezinho, olhae! estende a mão: 
«Quem dá esmola a D. Sebastião?» 

Esperae, esperae, ó Portuguezes! 
Que elle há-de vir, um dia! Esperae. 
Para os mortos os séculos são mezes, 
Ou menos que isso, nem um dia, ai. 
Tende paciência! finarão revezes; 
E até lá, Portuguezes! Trabalhae. 
Que El-Rey-Menino não tarda a surgir, 
Que elle há-de vir, há-de vir, há-de vir!





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