terça-feira, 17 de dezembro de 2013

A Vida de Aristóteles segundo Diógenes Laércio

Escrito por Diógenes Laércio




Alexandre e Aristóteles


«Um dia, em meados do Verão do ano de 366 [a. C.], apresentou-se um jovem para se matricular na Academia de Platão. Vinha da cidade macedónia de Estagira, o "Oeste Selvagem" do mundo ateniense. Sem embargo, nada havia de rústico no elegante rapaz. Era a imagem perfeita do requinte, pois fora educado num ambiente de cultura. O pai, já falecido, fora médico na corte de Amintas, rei da Macedónia e avô de Alexandre. Desde a primeira infância, o jovem Aristóteles fora adestrado para uma vida de disciplina mental e conforto físico.

A sua chegada à Academia provocou sensação entre os demais estudantes. Porque se tratava dum aristocrata - afável, bizarro, gracioso, de voz branda, delicado, polido, modelo de bom proceder e de elegância no trajar. Falava com um acento afectado, e prestava mais atenção às suas roupas - como se queixava Platão - do que convinha a alguém que amasse sinceramente a sabedoria.

Evidenciava, contudo, aptidões intelectuais incrivelmente variadas. Parecia quase impossível um só espírito estar aberto a tantas facetas do conhecimento. Política, drama, poesia, física, medicina, psicologia, história, lógica, astronomia, ética, história natural, matemática, retórica, biologia - eram estes apenas alguns pratos do variadíssimo banquete com o qual procurava o jovem estudante alimentar o seu voraz apetite de saber. Certa vez, Platão observou que a sua Academia se compunha de duas partes - o corpo do seus estudantes e o espírito de Aristóteles.

Como era de esperar, o maior mestre e o estudante mais insigne de Atenas não poderiam continuar juntos. Quando um grego se encontra com outro, especialmente num nível de igualdade mental, o choque torna-se iminente. O jovem e o velho filósofo disputavam amiúde, se bem que mutuamente se adorassem.

Quando Platão morreu (347 a. C.), Aristóteles tinha trinta e sete anos. Esperava justamente ser escolhido como sucessor de Platão na presidência da Academia. Todavia, sofreu uma desilusão. Os administradores da Academia rejeitaram-no como "estrangeiro" e elegeram, em seu lugar, um ateniense. Irritado com o seu desaire, Aristóteles procurou uma oportunidade para sair de Atenas. Encontrou-a sob a forma dum convite de um dos seus antigos condiscípulos, Hermias. Esse filósofo-político obtivera a suserania dum grande território na Ásia Menor. Como Dionísio, rei de Siracusa, almejava experimentar um governo sábio, contanto que a sabedoria não lhe interferisse com as riquezas. E, assim, convidou Aristóteles para lhe ensinar como conciliar a justiça abstracta com o esbulho concreto.

Aristóteles, porém, interessava-se apenas pela justiça. Falhou, portanto, na sua missão de afastar o amigo da procura de riquezas e encaminhá-lo no sentido da equidade. Conseguiu, no entanto, casar com Pítia, a encantadora filha adoptiva de Hermias. E, conquanto amasse a jovem por si própria, não fez objecções ao belo dote que ela trouxe consigo. Aristóteles, (...) não era contrário a uma "justa medida" de prosperidade. Na realidade, considerava-a como um dos requisitos essenciais a uma vida feliz.

Casou com Pítia, empregou o seu dinheiro, e passou a sua lua-de-mel a catar conchinhas do mar para os seus estudos científicos.

Terminada a lua-de-mel, voltou à corte de Hermias. Foi curta, todavia, a sua estada nessa corte. As intrigas de Hermias haviam despertado a ira dum rei persa. Os persas invadiram-lhe o país, aprisionaram-no e crucificaram-no.

Mais uma vez, Aristóteles se viu sem pátria (...). Novamente, contudo, acudiu-lhe em auxílio um amigo real. Desta feita, foi o rei Filipe da Macedónia, filho de Amintas e pai de Alexandre, que o convidou para residir no seu palácio, como tutor de Alexandre.




Quando Aristóteles voltou à corte na qual seu pai servira como médico real, sentiu-se "como um peixe fora de água". A atmosfera macedónia, naquele momento, não era adequada à meditação filosófica. Era uma atmosfera de desregrada ambição, bárbaro esplendor e bárbara vulgaridade. O rei Filipe era homem de inteligência superior, mas de baixa educação. Usava uma linguagem eriçada de erros gramaticais. "Não sou um bárbaro", - insistia, e não desejava também que seu filho fosse um "bárbaro". Na verdade, queria que Alexandre se transformasse num requintado filósofo. Tanto valia querer transformar uma voragem turbilhonante em plácido lago. Alexandre era a cria indomada dum leão feroz. Na realidade, toda a corte de assemelhava a uma floresta cheia de feras raivosas. Disputas, duelos, devassidões, assassínios - tudo isso andava na ordem do dia. Olímpia, a esposa do rei Filipe, chegava às raias da loucura, e o marido e o filho não lhe ficavam muito atrás. Num dos banquetes reais, Filipe tentou apunhalar Alexandre, porque o rapaz o insultara. E Alexandre, para que o não superassem, desfechou um ataque homicida contra o pai. Felizmente para os dois, (...) os circunstantes conseguiram apartá-los».

Henry Thomas e Dana Lee Thomas («Vidas de Grandes Filósofos»).


«Aristóteles nasceu em 385 a. C., em Estagira, na Trácia. Estagira, cidadezinha situada na costa setentrional do mar Egeu, fora fundada por colonos gregos; segundo se julga, erguia-se no local actualmente ocupado por Stavro.

Aristóteles era ainda muito novo quando perdeu o pai, Nicómaco, médico bastante afamado e neto de Esculápio. A criança foi provavelmente criada por um amigo da família, Próxeno, o qual vivia em Estagira. Aos dezassete anos, chega a Atenas no intuito de aí prosseguir os seus estudos. Em 367, quando Platão regressa da Sicília e retoma as suas aulas na Academia, Aristóteles encontra-se entre os seus alunos mais assíduos, distinguindo-se pelo seu ardor e inteligência, de tal modo que o Mestre, ao falar dele, apelidava-o sempre de "a inteligência da Escola".

Após alguns anos de estudo, Aristóteles teria rompido bruscamente com Platão, e Diógenes Láercio conta-nos que Platão teria dito a esse respeito que Aristóteles lhe dera um pontapé à semelhança do pinto que rejeita a mãe. Mas os relatos de Diógenes Laércio carecem de confirmação, parecendo que neste caso se limitou a fazer eco de uma simples lenda. Sem dúvida, Aristóteles opôs-se frequentemente a Platão no campo doutrinal, mas nunca deixou, apesar disso, de lhe testemunhar o seu respeito, tendo sempre conservado dele uma grata recordação. Assim, na Ética a Nicómaco, escreve: "É preferível, sem dúvida, fazer incidir o nosso exame sobre o estudo do bem genericamente considerado e a questão de saber em que é que ele consiste. É certo que uma tal investigação se torna difícil, já que foram alguns dos nossos amigos que introduziram a doutrina das Ideias. De acordo com o senso comum, talvez seja melhor e até indispensável, a fim de salvaguardar a verdade, sacrificar as nossas opiniões pessoais, tanto mais que também somos filósofos. Pode ter-se afecto pelos amigos e pela verdade; mas, a moralidade obriga-nos a dar preferência à verdade". O que foi traduzido pelo adágio: amicus Plato, sed magis amica veritas [Estimo Platão, mas estimo mais ainda a verdade, sentença tirada da Vida de Aristóteles, por Amónio, fundador da escola neoplatónica].



Platão e Aristóteles



(...) Aristóteles deixava dois filhos, uma rapariga, Pítias, nome herdado de sua mulher, e um rapaz, Nicómaco, nome que pertencera igualmente a seu pai. Diógenes Laércio legou-nos uma parcela do seu testamento. O filósofo não se limita a dizer aquilo que deseja para os seus filhos, pois não esquece igualmente todos os que viveram perto dele e esforça-se, pelas suas liberdades, por lhes tornar a vida possível. "Proíbo que sejam vendidas as crianças que estavam a meu serviço, devendo todas elas ser antes mantidas em minha casa até alcançarem a maturidade, altura em que deverão ser libertas a título de recompensa. A Simo, para além do dinheiro que já lhe dei para comprar um escravo, comprar-se-á outro escravo e será dado mais algum dinheiro... Quanto à imagem da minha mãe, deverá ser colocada no templo de Deméter, em Nemeia...".

As cinzas de Aristóteles foram inumadas em Estagira e, tal como fora seu pedido, as ossadas de Pítias, sua mulher, foram igualmente colocadas no seu túmulo.

Eis, portanto, os dados praticamente certos de que temos conhecimento acerca deste filósofo, um dos maiores de sempre e talvez aquele que maior influência exerceu na evolução do pensamento humano».

André Cresson («Aristóteles»).


«Até hoje, na sequência do que já reconhecera P. Gomes na sua nota introdutória às Categorias de Aristóteles, a verdade é que os portugueses ainda não se libertaram da já longa "falência dos institutos universitários e da educação pátria". Senão vejamos: saberão os portugueses por que razão Silvestre Pinheiro Ferreira optou por traduzir ousia por essência, até então traduzida por substantia na língua do culto e da cultura católicas? Depois, saberão ainda por que permanecem sobre o jugo de "traduções intermediárias e obscurantistas, assim como dos respectivos prefácios tendenciosos"? E, por último, saberão por que razão é que portugueses como Pinharanda Gomes, Orlando Vitorino (cf. aqui) e Álvaro Ribeiro continuam praticamente esquecidos nas traduções que fizeram em benefício da cultura portuguesa?

No fundo, é como dizer que os textos, para ganharem vida, precisam do espírito que os anima. E se bem que os escritos de Aristóteles sejam obra humana, eles são, no entanto, susceptíveis de, uma vez actualizado o Verbo mediador entre a Letra e o Espírito, serem entendidos como via de acesso à "filosofia natural do homem". Aliás, nesse sentido o entendera o Padre Manuel Alonso quando, considerando a "Expositio libri de anima" como estando à altura dos melhores autores do século XIII, se apercebera de "como mediante tão imperfeitas traduções e tão escassos recursos chegaram aqueles autores a uma clarividência tão precisa dos conceitos aristotélicos".

Não foi, porém, o estudioso espanhol o único a reconhecer o significado sempre actual do dinamismo aristotélico, pois também Olavo de Carvalho, referindo-se à "ideia medular" que atravessa a obra do Filósofo, por ele denominada a Teoria dos Quatro Discursos, não deixa de considerar admirável como S. Tomás de Aquino, sem acesso directo à Poética de Aristóteles, tivesse percebido, "raciocinando, como o fez, desde fontes de segunda mão", a "unidade" das quatro ciências lógicas. Em suma: pensar Aristóteles, compreender inclusivamente os quatro graus da lógica, requer o "acto de captar a unidade do pensamento de um homem desde as suas próprias intenções e valores em vez de julgá-lo de fora; acto que implica respeitar cuidadosamente o inexpressivo e o subentendido em vez de sufocá-lo na idolatria do 'texto' coisificado, túmulo do pensamento"».

Miguel Bruno Duarte




A VIDA DE ARISTÓTELES segundo DIÓGENES LAÉRCIO



Platão e Aristóteles (Escola de Atenas, fresco renascentista de Rafael Sanzio de Urbino).



Aristóteles [384-322 a.C.], filho de Nicómaco e de Féstias, era oriundo de Estagira. Seu pai, Nicómaco, era filho de um outro Nicómaco, por sua vez filho de Macaon e descendente de Esculápio (cf. Hermipo, Livro sobre Aristóteles). Este Nicómaco era da estima de Amintas, rei da Macedónia, junto do qual viveu, por causa dos conhecimentos que possuía em medicina. Aristóteles foi o mais notável dos discípulos de Platão. Era um pouco tartamudo (cf. Timóteo de Atenas, Vidas). De pernas muito delgadas, segundo consta, tinha os olhos pequenos, gostava de vestir com sumptuosidade e rapava a barba. Teve um filho, Nicómaco, de sua mulher Herpília (cf. Timóteo). Abandonou Platão, sendo este ainda vivo, o que levou Platão a afirmar que Aristóteles o espezinhara como um potro, que dá uma parelha de coices na mãe. Quando Aristóteles se deslocou junto de Filipe na qualidade de embaixador de Atenas, Xenócrates assumiu a direcção da Academia (cf. Hermipo, Vida de Aristóteles). Ao regressar, Aristóteles, vendo o seu lugar ocupado, procurou no Liceu [Liceu ou Ginásio, perto do templo de Apolo Lykéios, em Atenas] um lugar para passear e para filosofar com os discípulos, enquanto passeavam. De onde a sua escola haver recebido o nome de peripatética [lugar de passeio], enquanto outros pretendem ver a origem deste nome no facto de ele passear enquanto conversava com Alexandre, que convalescia de uma doença. Logo que começou a ter um maior número de ouvintes, passou a ensinar sentado, e dizia:


Seria indecente se me calasse e deixasse falar Xenócrates.


Exercitava os discípulos na discussão de uma proposta questão, e além disso também lhes ensinava retórica.

Mais tarde foi visitar o eunuco Hermias, tirano de Atarneia. Pretende-se que Hermias era seu favorito, mas há quem afirme que ele se tornou seu parente por ter desposado sua filha ou sua sobrinha (cf. Demétrio de Magnésia, Livro dos Poetas e Escritores Homónimos). Demétrio também declara que este Hermias foi escravo de Eubulo, oriundo da Bitínia, e assassino do seu senhor. Por outro lado, Aristipo, no primeiro livro dos Prazeres dos Antigos, afirma que Aristóteles se enamorou da concubina de Hermias, e com a permissão deste casou com ela, tornando-se tão feliz, que chegou a oferecer-lhe sacrifícios ao modo como faziam os Atenienses a Deméter de Elêusis, e que escreveu para Hermias um hino, que adiante transcreverei.

A seguir, Aristóteles viajou para a Macedónia, para a corte de Filipe, que lhe entregou o preceptorado de seu filho Alexandre [que então, andava pela idade de treze anos}. Aristóteles esteve junto dele entre 343-335]. Solicitou deste príncipe relevasse a sua pátria destruída por Filipe, e logrou a causa. Elaborou leis para os seus compatriotas. À imitação de Xenócrates, deu também um regulamento à sua escola, decidindo que um chefe escolar seria nomeado de dez em dez dias. Logo que achou já ter passado muito tempo junto de Alexandre, Aristóteles regressou a Atenas, depois de haver recomendado o seu familiar Calísteno de Olinto ao príncipe. Acerca desta personagem, diz-se que Aristóteles o censurou por usar perante o monarca de uma grande liberdade de linguagem, e que, em vista de Calísteno não aceitar o seu conselho, o repreendeu nos seguintes termos:


Depressa morrerás, meu filho, se falares como falas.


O que deveras aconteceu. Foi acusado de participação na conjura de Hermolau contra Alexandre, encerrado numa gaiola de ferro, abandonado aos bichos e, por fim, lançado aos leões, que limparam os restos.


Mosaico de Alexandre, A Grande em Batalha


Nessa altura Aristóteles voltou a Atenas, dirigiu a escola durante treze anos, e depois saiu em segredo para Calcis, dado ter sido acusado de impiedade pelo hierofante Eurimédon ou por Demófilo (cf. Pavorino, Miscelâneas Históricas), por causa de um hino que Aristóteles compusera acerca de Hermias, e por causa de um epigrama que escrevera acerca de uma estátua de Delfos, e que dizia:


Esse homem aí, com impiedade e violação da justiça divina,
foi morto pelo rei dos Persas que trazem o arco;
Não foi vencido lealmente à lança num combate mortal,
Mas por um golpe pérfido e à má-fé.


Morreu nesta região, ao que consta, depois de haver bebido cicuta (cf. Eumélos, Histórias, livro V) com a idade de setenta anos. O mesmo autor afirma que foi discípulo de Platão na idade de trinta anos, no que se engana, pois, de facto, foi discípulo de Platão desde a idade de dezassete anos, tendo vivido sessenta e três anos. Quanto ao hino mencionado, ei-lo:



Virtude de aquisição tão difícil,
A mais bela caça que um homem pode cobiçar,
Tu és bela, ó jovem,
E é uma graça invejada na Grécia morrer por ti,
E sofrer sem ceder os males maiores,
Tanto tu pões nas almas
Um fruto imortal superior ao oiro,
Aos pais e ao suave repouso.
Foi por ti que Hércules e o filho de Leda
Suportavam tantos sofrimentos
Foi por te desejar que Aquiles
E Ajax às moradas do Hades,
Vieram, e foi ainda por amor
Pela tua beleza que um ateniense perdeu a vida,
Sendo por isso que é ilustre
E será imortalizado pelas Musas,
Filhas de Mnémosina,
Que exaltam a raça, a amizade, a glória do poderoso Zeus hospitaleiro.



Aristóteles


Acerca de Aristóteles escrevi o seguinte poema:


Aristóteles foi um dia acusado de impiedade
Por Eurimédon, sacerdote de Deméter, deusa dos mistérios
Bebendo a cicuta, escapou: foi o modo
De se livrar de injustas calúnias com uma exígua pena.


Favorino (Miscelâneas Históricas) diz que Aristóteles fez o seu primeiro discurso forense em autodefesa durante o processo de impiedade que lhe moveram, e que declarou aos Atenienses:


A pera cresce na pereira e o figo na figueira.


Apolodoro também escreve nas Crónicas que Aristóteles nasceu no ano da nonagésima nona Olimpíada, que se encontrou com Platão aos dezassete anos e viveu com ele durante vinte anos, que regressou a Mitilene durante o arcontado de Eubulo, no quarto ano da centésima oitava Olimpíada, que, falecido Platão no ano primeiro desta mesma Olimpíada, sob o arcontado de Teófilo, Aristóteles foi ao encontro de Hermias, em casa de quem viveu três anos, que, no arcontado de Pítodoto, passou à casa de Filipe, no décimo segundo ano da centésima nona Olimpíada, e que se manteve durante treze anos como mestre escola no Liceu, que, depois, foi para Calcis, no terceiro ano da centésima décima quarta Olimpíada, e que morreu de doença por volta dos sessenta e três anos de idade, ao mesmo tempo que Demóstenes morria em Calúria, no arcontado de Pítocles.

Também se diz que, por causa da conjura de Calísteno contra Alexandre, descontentou este monarca, que, para o castigar, cumulou de honras a Anaxímenes, e enviou presentes a Xenócrates. Teócrito de Quios ridicularizou-o em um epigrama (cf. Ambrion, Livro sobre Teócrito):


Do eunuco Hermias, escravo de Eubulo,
Aristóteles o espírito vazio elevou a vazio túmulo
(Como era um feixe de palha, escolheu para morar,
Em vez da Academia, a embocadura do atoleiro).


Timão, naturalmente, também o ataca:


Nem a futilidade nem a estupidez de Aristóteles.










(...) Também se diz que se acharam em sua casa numerosos vasos de cobre, e Lícon afirma que se ungia numa banheira cheia de azeite quente e que a seguir vendia o azeite. Há quem acrescente que punha sobre o peito um pequeno vaso também cheio de azeite quente e que, antes de dormir, pegava numa bola de bronze e punha-a sobre uma bacia, para que a bola, ao cair da bacia, fizesse um ruído que o acordasse. São-lhe atribuídas muitas e belas sentenças, como as seguintes:

Foi-lhe perguntando o que se ganhava em mentir: «Não merecer crédito quando se diz a verdade». Reprovava-se-lhe o facto de ter dó de um malandro. Respondeu que cuidava do homem e não dos seus hábitos. Gostava de dizer com frequência aos amigos e aos discípulos, sempre que os encontrava, que a vista tira a luz do ar ambiente, e a alma da sabedoria. Indignava-se muitas vezes contra os Atenienses, e dizia: «Inventaram o trigo e as leis, mas enquanto utilizam o trigo esquecem as leis». «A educação - afirmava - tem raízes amargas, mas frutos bem doces». Foi-lhe perguntado: «O que envelhece depressa?» - «A gratidão». - «Que é a esperança? «O sonho de um homem acordado». Um dia, Diógenes ofereceu-lhe uns figos secos, com a intenção, se Aristóteles os recusasse, de o sujeitar a ridículo. Mas Aristóteles aceitou-os de boa mente, e disse a Diógenes que tinha perdido de uma só vez os figos e a graça. Diógenes voltou a oferecer-lhe figos. Aristóteles pegou no figo, ergueu-o no ar, e exclamou como as crianças: «Diógenes é grande», e devolveu-lhe o figo. Afirmava haver três coisas necessárias à educação: um bom temperamento, um bom ensino, e trabalho. Sabendo que alguém o injuriara, respondeu: «Pode bater-me como quiser, desde que eu esteja ausente». Defendia que a beleza era um apoio preferível a todas as cartas de recomendação.

Vários autores afirmam no entanto que este dito pertence a Diógenes, que Aristóteles tinha a beleza como um dom divino, enquanto Sócrates a concebia como um tirano de pouca dura, Platão um dom da natureza, Teofrasto uma ilusão muda, Teócrito um mal de marfim, e Carnéades uma realeza sem guarda armada. Perguntava-se-lhe: «Qual a diferença entre os sábios e os ignorantes?» - «A que há entre os vivos e os mortos». «A sabedoria - declarava - serve de ornamento na graça, e de consolação na desgraça». «Os pais que ensinam os filhos são mais dignos de estima do que os que se contentam em lhes dar a vida, pois estes dão apenas o meio de viver e, os primeiros, o meio de bem viver». Um homem gabava-se na sua presença de ser natural de uma importante cidade: «O que importa não é isso, mas se somos dignos de ser naturais de uma outra cidade importante». Perguntaram-lhe: «Que é um amigo?» - «Uma só alma em dois corpos». Dizia que entre os homens havia os que eram avaros, como se tivessem de viver sempre, e os que eram pródigos, como se fossem morrer daí a uma hora. Alguém queria saber o motivo por que se procura mais o convívio dos belos. «É uma questão - respondia - de cego». Perguntavam-lhe: «Que benefício tira da filosofia?» «O de fazer sem constrangimento e de livre vontade o que outros fazem por temor da lei». «Quando se consegue que os alunos progridam?» - «Quando os mais adiantados não esperam pelos outros». A um fala-barato que lhe perguntava, depois de lhe ter massacrado a cabeça, se o não tinha incomodado, respondeu: «De modo nenhum, porque não estive a escutá-lo». Alguém o censurou por ter dado uma esmola a um vadio; respondeu (o episódio também é relatado nesta versão): «Não dei ao indivíduo, mas ao homem». Interrogaram-no sobre o comportamento a ter com os amigos: «Como gostaríamos que se comportassem connosco». Definia a justiça como uma virtude de alma, que leva a dar a cada um segundo o mérito. Dizia que o estudo era o melhor viático para chegar à velhice. Favorino também diz (Memórias, Livro II) que gostava de exclamar: «Ó meus amigos, não há amigo». E de facto podemos ler este dito no sétimo livro de Ética («A VIDA DE ARISTÓTELES segundo DIÓGENES LAÉRCIO», in Aristóteles, Organon, I - CATEGORIAS, II - PERIÉRMENEIAS. Guimarães Editores, pp. 19-22 e 25-27).






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