Escrito por Silvino Silvério Marques
«Um dia, chegou o momento mais infamante da nossa História oito vezes secular e este Homem de
alma grande, vertical, pujante de carácter, de inteligência e de cultura, com
serviços prestados à Pátria com garra e determinação, sofreria as agruras mais vergonhosas apenas pela sua honrosa condição de ter sido, verdadeiramente, um
português de lei.
Foi perseguido, preso e humilhado. Mas não
quebrou nem torceu. Depois do exílio e da doença, que para sempre o marcariam,
continuou lutando com o fulgor da sua inteligência nas diversas tribunas aonde
podia chegar, contra os desvarios dos tempos e dos homens. A sua estatura
moral, o seu exemplo de lutador, faziam seguramente inveja aos pigmeus que por
aí pululam, vaidosos e inchados, como senhores dos destinos e do porvir da
Nação que vão traindo, dia após dia, pelas mais diversas formas, sem honra e
sem pudor.
Deus levou-o do nosso convívio, em hora triste e inquietante. Nesse momento da sua Ressurreição em Cristo em nós ficou a mais profunda saudade. Foi um pouco da nossa Pátria que com ele desapareceu. Mas a História, essa, já lhe fez justiça e o consagrou.»
Vasco Leónidas («A História já o Consagrou»).
Franco Nogueira
Estava em Angola. Alguns sacerdotes, em geral de missões protestantes, eram conhecidos pelo apoio que davam à subversão. Estabeleci a regra de não deixar regressar à Província tais sacerdotes que partissem de férias. Passado muito tempo sobre a aplicação de tal medida, foi chamada a minha atenção para as reclamações que a mesma estava originando junto das nossas instâncias diplomáticas. Retorqui então que não podíamos combater «na frente» de armas na mão e admitir que «na retaguarda» fosse conduzida, por poderosas missões religiosas, a subversão mental das populações. O assunto foi, na altura, ultrapassado. Mas numa das minhas vindas a Lisboa, foi-me pedido que sobre ele falasse com o Ministro dos Negócios Estrangeiros. Creio ter sido o primeiro encontro pessoal que tive com Franco Nogueira. Trocámos argumentos. Ficámos amigos.
Salazar ia ser rendido, após o acidente sofrido. O Almirante Américo Thomaz resolveu ouvir oficiosamente a opinião de algumas pessoas acerca de quem deveria ser convidado para tal rendição. Fui nesse sentido procurado por um ajudante do Chefe do Estado. E disse-lhe que considerava Franco Nogueira, pelo valoroso combate diplomático que havia sustentado, a pessoa que garantia a continuação da defesa intransigente do Ultramar.
Após o 25 de Abril foi-me pedida, em
nome de um dos partidos então criados, colaboração na preparação do capítulo de
um livro sobre a denominada «descolonização», capítulo referente às campanhas
militares. Prometi fazê-lo em conjunto com os últimos Comandantes-Chefes de
Angola, Moçambique e Guiné. Para um parágrafo relativo à «Posição Diplomática»
recorri a Franco Nogueira, então ausente do País, que prontamente me ofereceu
elementos essenciais. Concluído o trabalho, foi resolvido, dada a sua extensão
e forma, autonomizá-lo em livro que foi editado sob o título África – A Vitória
Traída.
Estes são episódios reveladores de consideração e amizade, que nos vêm à memória ao recordar esse grande Português que foi um dos mais valorosos combatentes da independência e integridade de Portugal, então entendido do Minho a Timor, como sentiram e viveram os maiores espíritos da Monarquia e das 1.ª e 2. ª Repúblicas.
Tive, com alguns amigos, o privilégio de, nos últimos anos, conviver, em tertúlia, que mensalmente nos reunia, com o espírito brilhante de Franco Nogueira. Testemunha de sua inteligência viva, de sua excelente cultura, aqui deixo homenagem ao seu estrénuo e esclarecido patriotismo. Ausente, Portugal ficou mais pobre e mais fraco!
(In Embaixador Franco Nogueira [1918-1993] – Textos evocativos, Livraria Civilização Editora, 1.ª edição/Outubro 1999, pp. 507-508).
Silvino Silvério Marques |
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