Carlos Fernandes (in O cônsul Aristides Sousa Mendes: a Verdade e a Mentira, p. 62).
«(…) em 1923, quando servia em São Francisco, Sousa Mendes entrou em choque com a comunidade portuguesa local ao pedir uma contribuição para uma instituição de caridade portuguesa, que os luso-americanos se negaram a pagar. O assunto, que não foi comunicado ao MNE, chegou à imprensa sob forma de insultos, e aos ouvidos do MNE, que o considerou erro grave…».
Avraham Milgram («Portugal, Salazar e os Judeus», Gradiva, 2010, p. 102).
«Trabalhando 42 horas naqueles três dias, que nem foram dias completos, porque, no dia 18, o Consulado esteve encerrado, não sabemos porquê nem por quanto tempo, isto daria 14 horas de trabalho diário, ou seja, das 9 horas da manhã até às 11 horas da noite, o que não creio que se pudesse manter assim naqueles três dias seguidos, tanto mais que Seabra, não concordando com os vistos irregulares, certamente não estaria com o espírito zeloso de Aristides, prestando-se a trabalhar 14 horas diárias durante três dias seguidos. E sabemos que não esteve. Mas, mesmo que todos cumprissem as 14 horas diárias (das 9 às 11 da noite), teríamos, no máximo, cerca de 630 vistos, no total dos três dias da ira (2.520 minutos, a dividir por 4 minutos por cada visto, em média, teríamos 630 vistos), o que está de harmonia tanto com o testemunho de Seabra como com os registos consulares, que passaram, dos dias 17 inclusive para 19 inclusive, de cerca de 1.900 para cerca de 2.500».
Carlos Fernandes (in op. cit., pp. 110-111).
Na sequência da polémica suscitada pela entrevista realizada no semanário O Diabo (2 de Julho de 2013) ao autor de O cônsul Aristides Sousa Mendes: a Verdade e a Mentira, veio, no número imediatamente seguinte (9 de Julho de 2013), este trecho deveras significativo:
«O Professor José Hermano Saraiva revela no volume 6.º das suas Memórias, publicadas pelo semanário “Sol”, uma conversa com o Professor Leite Pinto: “Fala, a propósito, na operação de salvamento dos refugiados republicanos espanhóis e dos judeus que, no início da Segunda Guerra Mundial, se acumulavam na fronteira de Irun, na ânsia de salvar as vidas. Vieram embarcados nos vagões da Companhia dos Caminhos de Ferro da Beira Alta, que iam até Irun carregados de Volfrâmio, e voltavam a Vilar Formoso carregados de fugitivos. (…) Segundo um protocolo firmado pelas autoridades ferroviárias dos dois países, os vagões deviam circular selados, quer à ida quer à vinda. Um dos que assim salvaram a vida foi o Barão de Rothschild. O embaixador Teixeira de Sampaio confirmou-me, mais tarde, esses factos. O salvamento de 30.000 refugiados deu-se ao mesmo tempo que o cônsul de Portugal em Bordéus, em cumplicidade com dois funcionários da PIDE, falsificava algumas centenas de vistos, que vendia por bom preço a emigrantes com dinheiro. Um dos que utilizaram esta via supôs que todos os outros vieram do mesmo modo – e assim nasceu a versão, hoje oficialmente consagrada, de que a operação de salvamento se deve ao cônsul de Bordéus, Aristides de Sousa Mendes. Este, homem muito afecto ao Estado Novo, nem sequer foi demitido, mas sim colocado na situação de aguardar aposentação. Os seus cúmplices da PIDE foram julgados, condenados e demitidos”».
José Hermano Saraiva
«“(…) Maurice Sachs, um judeu que criticava esses fuyards, disse que causavam riso, ao darem-se uma suposta grande importância, anunciando que tinham a vida em perigo perante o avanço rápido dos alemães pela França fora, como se Hitler estivesse preocupado em os encontrar para os meter num campo de concentração ou fuzilá-los imediatamente. Não sou eu que digo isto, é Sachs!”. Isto é: o “que se passou em França, a partir de 1942, é outra história (…). Era o futuro; não foi o presente em 1940…».
Carlos Fernandes (in op. cit., pp. 36-37).
«Hjalmar Schacht, no pós-guerra, desafiou os inquiridores de Nuremberga ao dizer que o programa da Nova Ordem de Hitler correspondia ao programa do New Deal de Roosevelt nos Estados Unidos. Os inquiridores, naturalmente, rejeitaram, com ar de bazófia, uma tal afirmação. Contudo, a mais pequena investigação diz-nos que os dois programas são não só bastante similares, como também revela que os alemães não tiveram nenhuma dificuldade em mostrar a respectiva similitude...».
Antony Sutton («Wall Street and the Rise of Hitler», Clairview, 2010, p. 120).
«É sabido que F. D. Roosevelt procurara resolver os problemas dos refugiados judeus mediante a criação de uma entidade política judaica em Angola. Contudo, um tal empreendimento só indica que os americanos ignoravam de todo que Salazar jamais permitiria a venda ou a transferência de uma parte do Império Português para o devido efeito. Assim, apostavam "na criação de uma espécie de protectorado que traria a Portugal benefícios" de utilidade financeira, económica e comercial que seria muito superior "aos lucros que o país teria se continuasse a manter Angola sozinho" (in Avraham Milgram, op. cit., pp. 123-124).
Realmente, os americanos não compreendiam verdadeiramente com quem estavam a lidar, na medida em que sempre revelaram enorme dificuldade em apreender outras culturas, povos e nações do mundo. E daí a razão por que Oliveira Salazar não confiava nos americanos e na sua nação tipicamente moderna. Por conseguinte, o plano americano caíra em saco roto, até porque a Inglaterra, cuja política externa procurava apaziguar os árabes e reduzir as suas forças no Mediterrâneo Oriental, queria "continuar de boas relações com Portugal e não abalar o status quo na Península Ibérica"» (ibidem, pp. 124-125).
Quase um triénio depois, Salazar, na qualidade de titular da pasta dos Negócios Estrangeiros, entre outras pastas de que então se ocupava com grande sacrifício e abnegação pessoal, deparava-se com o começo da mais brutal, violenta e destrutiva guerra mundial do século XX. E nisto, perante a onda de refugiados vindos da Europa Central e Oriental, eis senão o "messianismo salvífico" do cônsul Sousa Mendes personificado num acto de loucura delirante: "Vou salvá-los todos". Todavia, as consequências desse acto foram, precisamente ao contrário do que os panegiristas de Sousa Mendes apregoam, atenuadas por quem mais se tem atacado na campanha interna e internacional em voga: António de Oliveira Salazar».
Miguel Bruno Duarte
«O desconhecimento das coisas portuguesas está sem dúvida na base da expansão de notícias falsas e da credulidade geral; mas quem cria e alimenta os boatos é perfeitamente conhecedor das situações e dos problemas, e sabe como deve actuar. A situação de Portugal na Península hispânica, a sua posição política e moral contra o comunismo, os seus vastos interesses e direitos coloniais, bem alicerçados e definidos, a maneira como entende conduzir os seus destinos, dão-nos neste momento preciso, relevo entre as Potências. E não é que pretensiosamente nos ponhamos em bicos de pés para nos verem; outros se sentem obrigados a atribuir-nos importância real. E por isso alguns nos consideram importunos e incómodos, e nos acusam perante o mundo, e nos promoveram a revolta dos marujos, e nos presentearam com explosão de bombas, e maquinam incessantemente contra nós, e sem cessar nos agridem e levantam boatos sobre as nossas colónias que, a traduzirem a verdade dos factos, só demonstrariam impotência ou insensibilidade patriótica.
Oliveira Salazar |
Oliveira Salazar («O suposto arrendamento de Angola à Alemanha», nota oficiosa publicada nos jornais de 29 de Janeiro de 1937, in Discursos e Notas Políticas, II, 1935-1937, Coimbra Editora, 1945, pp. 257-259).
«Depois (...), penso ser conveniente, para que se veja a ignorância e a ligeireza dos deputados, evidenciar aqui o fundamental das suas intervenções, que, obviamente, não os honram nem honram a A. da República.
(...) Jaime Gama, que iniciou o debate (e é o agente de toda esta trapalhada reintegradora e pseudo-indemnizatória de Sousa Mendes), embora já tivesse sido Ministro dos Estrangeiros, demonstrou não saber, ou já ter esquecido que a carreira diplomática e a consular não são a mesma coisa (até a transferência de uma para a outra se faz, ou fazia, por decreto individual), e, portanto, Sousa Mendes nunca fôra diplomata mas sim cônsul, e o mais a que, teoricamente, poderia chegar seria a cônsul-geral, mas ele, legalmente, nem a isso.
Depois, Gama diz que Aristides fôra condenado à pena ilegal de ser colocado na disponibilidade aguardando aposentação, situação em que permaneceu por 14 anos, até à sua morte (menos o ilegal, tudo bem).
E, obviamente, sem o menor estudo ou exame crítico, repete a atoarda de que aquela iníqua decisão resultara de haver concedido vistos de entrada e de trânsito a milhares de refugiados judeus que escaparam ao holocausto e muitos outros resistentes ao nazismo cujas vidas se encontravam em perigo e procuravam em outros países a salvaguarda plena da sua integridade física. E propunha a reintegração de Aristides na carreira diplomática, a que nunca pertencera (aqui, nada é verdadeiro).
José Manuel Mendes diz uma série de excentricidades bem escusadas, acentuando que Bordéus seria uma cidade ocupada pelas tropas de Hitler (o que é completamente mentira) e, quase a terminar, elogia a condecoração dada a Aristides, "valorando o seu perfil de perseguido pelo escalracho salazarista" (quem é aqui o escalracho?!, um ditador moderado e legalista ou um totalitário estalinista, que, agora, toda a gente renega?).
Por sua vez, Isabel Espada qualifica Aristides de diplomata de carreira, que teria dado "milhares de vistos a judeus e outros refugiados da Alemanha nazi (mais uma descoberta), os quais desta forma escaparam à morte em campos de concentração" (quais e onde?).
Isto ter-lhe-á valido "a expulsão da carreira diplomática, situação em que se manteve até à sua morte" (como sabemos, é uma completa mentira), donde advieram as suas dificuldades económicas.
E, depois, "pensa-se que terá salvaguardado a segurança e integridade física de cerca de 30.000 refugiados", para terminar dizendo: "Pensar que Portugal proibiu a atribuição de vistos àqueles que, sem eles e por motivos de discriminação racial, estariam condenados à morte, enche-nos de vergonha, por essa parte da nossa história" (vergonha é mentir ou ser ignorante).
Narana Coissoró falou, tal como os outros, suponho que por ignorância indesculpável, não sabendo, portanto, o que disse, começando assim: "Este ilustre português e cabanense notabilizou-se no furor do nazismo, em 1940... ao possibilitar a fuga de cerca de 30.000 refugiados, na sua maior parte judeus, que assim escaparam à morte em campos de concentração e extermínio".
E, "isto valeu ao funcionário a expulsão da carreira diplomática", sendo um herói português (isto é mesmo à Narana, como se dizia no CDS; pobre Coissoró!).
Leonardo Ribeiro de Almeida, que foi o relator da famosa lei, também sem qualquer estudo ou exame crítico, disse: "O cônsul Sousa Mendes emitiu milhares de vistos em benefício de outros tantos cidadãos, na sua maioria judeus, que puderam, por essa via, alcançar a liberdade e fugir à deportação e à morte" (não carece de comentários, tal é a mentira e a insensatez de tudo isto).
Ora bem, a chamada solução do caso Sousa Mendes é o paradigma da ligeireza e completa politização com que se tem conduzido a res publica em Portugal.
De facto, depois de vermos a nossa A. da República e com que argumentos, por unanimidade e grande aplauso, orquestrados previamente entre os partidos, alegando as mesmas falácias e demonstrando, sobretudo os quatro deputados intervenientes no debate, completa falta de estudo e de espírito crítico - e admitimos que não tenham agido de má-fé, o que, apesar de tudo, os não desculpa -, admiram-se alguns do estado a que o Estado chegou, e onde, infelizmente, nos encontramos, sem se saber como nem quando poderemos sair do pântano em que nos meteram por incompetência e mendacidade.
A falsificação seja do que for, é a negação da verdade, e, como tal, aberrante, sendo a falsificação da história uma das mais aberrantes. E, se a falsificação for feita por diploma legislativo, estaremos perante a mais completa destruição de uma ordem social baseada no Direito e na Moral, que são os pilares da democracia.
A história não se faz por lei ou decreto-lei, que são sempre instrumentos políticos manuseáveis e manuseados por quem tem o poder de fazer a lei.
Ora, isto foi apanágio dos estalinismos, mas não pode sê-lo dos Estados de Direito».
Carlos Fernandes (in op. cit., pp. 256-259).
A Invenção dos 30.000 Vistos dos quais 10.000 para Judeus (ii)
Segundo os relatos generalizados, a 17 de Junho, mal saído da cama, Aristides proclamou que dava visto a quem o desejasse, mandando arautos junto da sinagoga em Bordéus, onde, naturalmente, havia muitos judeus, que nos parece que ele discriminava favoravelmente.
Sebastião Mendes fala em vistos gratuitos. No entanto, ou o secretário do Consulado, José Seabra, não aceitou que se dessem vistos gratuitos, ou Aristides não o terá tentado em Bordéus, já que todos os vistos ali dados, e que conhecemos, foram pagos, quer os dados regularmente quer irregularmente.
Eu, repito, ainda não consegui ver um visto dado por Sousa Mendes gratuitamente, parecendo que, quer em Bordéus quer em Bayonne, até que o cônsul Simeão o expulsou deste Consulado, todos os vistos, regulares ou irregulares, foram também pagos, e portanto registados.
Segundo dizem e Rui Afonso insinua, depois de expulso do Consulado em Bayonne e destituído em 23 de Junho, Aristides, que não regressou, oficialmente, a Bordéus, para partir imediatamente para Portugal, até, pelo menos, 26 de Junho, terá andado pela fronteira a dar vistos gratuitos a quem os quisesse, quer sobre documentos de viagem quer sobre qualquer papel (não há a certeza que ele tenha regressado a 26 a Bordéus).
Quantos terá assim dado, de forma completamente fora do normal e já destituído das funções de cônsul de Portugal em Bordéus?, ninguém sabe.
Porém, sabe-se, e Rui Afonso di-lo claramente, que os espanhóis recusaram reconhecer esses vistos, dados de forma tão estapafúrdia. Portanto, estes vistos, dados talvez com a melhor das intenções, foram completamente inúteis. Com eles, Aristides não pôde salvar ninguém, perdendo o seu tempo e criando aos refugiados mais problemas do que aqueles que já tinham.
Os refugiados que por lá ficaram foram, mais tarde, transportados gratuitamente para Portugal, no Sud Express, clandestinamente, às ordens de Leite Pinto. Mas Rui Afonso não quis dar projecção a esta importante acção humanitária de Portugal, pois não é de admitir que a desconhecesse, já que fala de tudo quanto há relativamente aos refugiados, incluído o seu mau transporte. Ou só lhe interessam os que contactaram Aristides?
Já dissemos, e reiteramo-lo agora, que Aristides, até deixar Bordéus, não poderia ter dado sequer 2.500 vistos. Cremos que tudo ficou provado e mais que provado supra. Isto demonstra a sem vergonha com que se inventam números fantásticos de judeus, a quem Aristides teria salvo da morte.
Daí que não tenham aparecido a ajudá-lo quando vivia na miséria.
No entanto, como dissemos, mesmo que isso não estivesse provadíssimo, como está, pelo número, que era materialmente impossível dar tantos vistos em três dias, vamos fazer um exercício de matemática para demonstrar tal impossibilidade, repetindo quase tudo o que já demonstrámos no capítulo anterior.
Quem dava os vistos? Aristides, um dos filhos e José Seabra, ou seja, três pessoas (o genro, que antes ajudara no Consulado, estava a caminho de Lisboa, chegando a Cabanas de Viriato a 22 de Junho, acompanhado de alguns refugiados, como Rui Afonso relata).
Ora, 3 dias perfazem 72 horas. Mesmo que só tirassem 10 horas para dormir, comer, toilette, etc.,, ficam 42 horas livres, ou seja 2.520 minutos.
Um visto, pago e registado, não se processa em menos de 5 minutos. Mas, admitamos que o zêlo (não de Seabra) e a destreza eram tais que tudo se faria em 4 minutos.
Ora, 2.520 minutos a dividir por quatro, dá 630 vistos. Daqui, para 30.000, Rui Afonso, vai uma pequena diferença!
Como se pode ser tão levianamente crente?!
Obviamente, como acima ficou provado, nem esse número deram, já que o visto dado a Torberg, em 19 de Junho de 1940 (último dia de Aristides como cônsul efectivo em Bordéus), tem o número de 2.245.
Assim, é evidente que Aristides salvou muito pouca gente, já que, como Seabra declarou, apenas de deram, naqueles três dias, umas centenas de vistos.
A razão alegada por Rui Afonso para José Seabra mentir não tem sentido, por vários motivos:
a) se o Governo entendesse que ele estava comprometido com os vistos irregulares, não lhe teria confiado o Consulado após a destituição de Aristides, em 23 de Junho;
b) quando foi ouvido no MNE disse que teriam emitido apenas algumas centenas de vistos, sabendo que a sua afirmação ia contra o que os panegiristas de Aristides andavam propalando, não se vendo razão para mentir;
c) os crimes de desobediência e abuso de poder (só praticados pelo cônsul Aristides) e outro praticado eventualmente por ambos, já tinham prescrito há mais de 35 anos, e Seabra sabia o que é isso de prescrição de um crime, sendo isto outra razão para não mentir;
d) depois, estava velho, tendo sido sempre homem de bem, não se vendo o seu menor interesse em mentir.
Mentiria por gosto? Que patetice (...).
Mas alguém mente, e de que maneira!
Por isso, talvez venha a propósito lembrar o dito latino, que já consta dos salmos bíblicos, e nos diz que omnis homo mendax.
É uma grande vergonha a tentativa de fazer de José Seabra um mentiroso, simplesmente porque não corroborou a aldrabice, do tamanho do Everest, dos 30.000 vistos, dos quais 10.000 a judeus. Mesmo quando esta aldrabice é incompatível com os registos consulares e com a possibilidade material de se efectivar no condicionalismo a que é referida.
Aristides de Sousa Mendes e o rabino Kruger. |
Já vimos estar provado que Aristides, em nome de Portugal, e dele exclusivamente, não chegou a dar em Bordéus, em todo o ano de 1940, 2.500 vistos, até sair para Bayonne, em 20 de Junho, e ser destituído em 23 do mesmo mês. Alguns destes vistos, não se sabe quantos, foram por ele dados irregularmente a quem Lisboa antes os negara (v.g. ao rabino Kruger) ou, pura e simplesmente, para quem nem sequer se pedira autorização a Lisboa.
Portanto, serão estes (os irregulares), e só estes, os que corresponderiam às pessoas que, segundo os panegiristas de Aristides, este salvaria da morte. Todos os outros terão sido salvos por Portugal e não por Aristides, individualmente.
Mas, que nós saibamos, Aristides nem sequer salvou ninguém da morte, tal como Portugal em França, porque naquela altura, ninguém ali estava em perigo de vida. Apenas deu uma série de vistos irregularmente, e parece que só, ou, sobretudo, a judeus, discriminando estes positivamente. Esta é a verdade.
Mas então, porque é que se tem deixado chegar tudo isto ao estado actual de quase mitificação? Porque os portugueses são um povo estranho, inconstante, muito moody, e tão ingrato como os deuses. Reparem que, sendo, no tempo de Salazar, quase toda a gente salazarista, como muitos milhares de políticos a ele favoráveis, depois de morto e mudado o regime 180 graus, salvo Franco Nogueira, Veiga de Macedo, e poucos mais, pode dizer-se que ninguém apareceu a defendê-lo, mesmo quanto às mais evidentes mentiras, e ainda ninguém o fez quanto às monstruosas atoardas do caso A. de Sousa Mendes, em que Salazar é persistentemente muito mal tratado - é o pendant do bom (Aristides) contra o mau (Salazar).
Não deixa de ser curioso, por estranho, que tenha sido preciso que alguém independente, sem a menor ligação política a Salazar, e até olhando com simpatia para Sousa Mendes, movido apenas pelo amor à verdade, e, porque, além de cansado de ouvir e ler tanta despudorada aldrabice, foi provocado, concretamente, para o fazer, decidisse vir a público enfrentar um lobby político e de interesses poderosíssimo, para repor as coisas nos seus devidos termos.
E terminamos este capítulo com um esclarecimento que ainda não vimos que fosse feito em qualquer das publicações que conhecemos relativamente à concessão de vistos por A. de Sousa Mendes: os vistos registados, numerados e taxados, quer dados regularmente quer irregularmente, foram dados em nome de Portugal, e são juridicamente válidos; os vistos revolucionários que Aristides terá dado em Bordéus e na fronteira franco-espanhola, sem registo ou numeração, ou taxação (se os deu), são juridicamente nulos, e, portanto, como diz a lei, de nenhum efeito.
Aristides, licenciado em Direito, sabia isto tão bem como qualquer outro jurista. Então, porque é que os deu? Só ele o sabe. Porque não creio que fosse para iludir aqueles a quem os terá dado.
É por isso que eu duvido, legitimamente, que ele assim tenha procedido, porque, além disso, teria usurpado funções, que é um crime grave. E, sem pretender ser senhor da verdade, entendo, que, se os deu, foi tresloucadamente, levado também pela ira.
Eu até chamo àqueles três dias 17, 18 e 19 de Junho) os dias da ira, como temos reiterado.
Falando com várias pessoas, cheguei à conclusão de que há quem não perceba bem esta trapalhada dos vistos consulares em Bordéus.
Por isso, peço aos que sabem que me perdoem este esclarecimento.
Salvo, agora, na UE, entre os Estados membros do acordo de Schengen, ou quando haja outros acordos bilaterais ou multilaterais sobre isenção de vistos consulares, em geral, não se entra em país estrangeiro sem um visto consular dado por esse país, a permitir essa entrada.
Por vezes é complicado, como actualmente com Angola.
E tem de ser, obviamente, um visto válido, dado em documento de viagem válido (normalmente, passaporte). Quando isto não acontece, ao viajante não é permitido entrar nesse país que detectou quer a falsidade quer a não existência ou inviabilidade do visto exibido.
Por isso, os vistos que Sousa Mendes deu com carácter revolucionário, como já referimos supra, não salvaram ninguém, poque não foram aceites pelas autoridades espanholas da fronteira-espanhola, sendo juridicamente nulos, e até assim classificados por Portugal, e, consequentemente, de nenhum valor.
Esta gente terá por isso ficado retida na fronteira, tal como muitos outros, só vindo para Portugal, clandestinamente, através da operação Leite Pinto, que, por ser secreta e até clandestina, não foi dela dado conhecimento público logo na altura da sua efectivação.
No entanto, é caso para perguntar a este embaixador, que suponho político e judeu, se os serviços consulares da sua embaixada poderiam emitir numa só semana, dez mil vistos, apenas com um funcionário consular e dois ajudantes.
Demais, a rebeldia de Aristides não durou uma semana em Bordéus, mas apenas três dias incompletos.
E, como comprovámos, Aristides não deu então dez mil vistos, mas apenas pouco mais de seiscentos.
E Neill Lochery, no seu livro, agora editado pela Presença, "Lisboa. A Guerra das Sombras na Cidade da Luz (1936-1945)", aventa que Aristides teria concedido 2.862 vistos nos dia da sua rebelião pública contra o MNE. É óbvio tratar-se de um número psicologicamente fabricado, para dar a impressão de que é exacto e comprovado?, quando já vimos que Aristides, em todo o meio ano de 1940 em que foi cônsul em Bordéus, até ser destituído dessa função consular em 23 de Junho, não chegou a registar 2.500 vistos entre regulares e irregulares.
Quer dizer, cada um inventa e aventa o número de vistos que lhe apetece. Em todo o caso, tanto o embaixador americano como Lochery, não aceitaram a aldrabice dos 30.000 vistos dos quais 10.000 a judeus que tanto agradaram a Rui Afonso como à nossa Assembleia da República (...).
Para terminar, é necessário reiterar e realçar que o cônsul Aristides não só nunca referiu ter dado tal número de vistos consulares como também nunca quantificou os vistos que dera a judeus e não judeus. Foi a partir do filho Sebastião e dos mitificadores acríticos de Sousa Mendes que, posteriormente, se inventaram estes números teratológicos, e, obviamente, falsos, como acabámos de provar.
Como já observámos, há muito boa gente que, sem saber o que se passou com Aristides em fins de Maio e meados de 1940, em Bordéus e Bayonne, quer ser tão salvadora de judeus como lhe contam, mentindo, que Aristides foi. Agem por outiva, sem se preocuparem com a mais elementar crítica. Isto resulta de, até hoje, ninguém ter aparecido a repor a verdade contra uma corrente avassaladora de falácias, motivadas por razões políticas e económicas, desde o congressista democrático americano Tony Coelho, passando pelos filhos de Sousa Mendes, até Rui Afonso, Jaime Gama, e outros deputados e políticos portugueses... (in op. cit., pp. 125-133).
Continua
Estranho tais comentários, uma vez que os judeus sabem quem os ajudou e não o teriam distinguido se a sua ajuda tivesse sido como aqui descrito.
ResponderExcluirOra, em primeiro lugar não estamos perante comentários, nem sequer ante uma descrição, mas, sim, perante alguns trechos de um livro cujo autor procurou coligir factos que, relativamente ao caso de A. de Sousa Mendes, foram objectivamente omitidos, quando não mesmo deturpados com vista a um rol de mentiras, mentirolas e meias-verdades para embalar os tolos. Em segundo lugar, se os judeus estão assim tão certos dos 30 000 refugiados (10 000 dos quais judeus) alegadamente salvos por A. de Sousa Mendes, que nos venham então explicar como é que o «Schindler português», pese embora auxiliado, conseguira, em apenas três dias, passar os 30 000 vistos?
ResponderExcluirP.S. Quem quiser comentar seja o que for, aqui no "Liceu", esteja à vontade; agora, tenham a hombridade de dar o nome ou a cara. Caso contrário, de ora avante apago logo o comentário. E não se aceitam descrições!