Ver 1, 2, 3, 4 e 5 |
Desfile em Luanda de tropas portuguesas chegadas de Lisboa. |
Ver 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12 |
«Alguns dos oradores da ONU, sem bem cuidarem dos termos da Carta, deram a entender não desejar outra coisa senão que as populações exprimam claramente a sua opção por Portugal, embora esta esteja feita desde recuados tempos, e constitucionalmente admitida e consolidada. Isso se chama a autodeterminação, princípio genial de caos nas sociedades humanas».
Oliveira Salazar («O Ultramar Português e a ONU»).
Visando a sistematização de princípios, intuições e noemas radicados no mundo do espírito, e, portanto, aptos a transcenderem a perfídia, a cobardia e a ignorância preponderantes nas instituições universitárias, por, de facto, se encontrarem espiritualmente vazias, censoriamente activas e culturalmente mortas, dividiremos por partes, com os devidos subtítulos, o escrito que agora se segue.
A teia anglo-americana
Antes de mais, o termo “Nações Unidas” fora previamente usado por Franklin D. Roosevelt para descrever não só o Ocidente mas também os Aliados do Leste. Oficialmente, tal termo impor-se-ia a 1 de Janeiro de 1942 aquando da adesão de um grupo de 26 governos no intuito de se comprometerem numa visão comum para o mundo do pós-guerra. De resto, a futura organização resultaria de um deliberado plano referente à criação de uma nova ordem internacional, prontamente delineada, em 1939, pelo Departamento de Estado norte-americano (1).
Deste modo, terminada a Segunda Guerra Mundial, a ONU passaria então a ser apresentada como uma entidade supranacional cuja finalidade seria determinar, implementar e garantir uma cultura unificada, bem como a desejada felicidade económica dos povos, a paz e a segurança internacionais num derradeiro esforço de universalismo unido em torno de um governo planetário comum. Porém, convém realçar que, no âmbito do já referido Departamento de Estado norte-americano, tais desígnios teriam sido particularmente elaborados pela Divisão de Planeamento da Política Externa do Pós-Guerra, dirigida por Alger Hiss, que era, nem mais nem menos, um espião soviético (2). Por conseguinte, seria ainda Hiss quem, a 25 de Abril de 1945, daria a conhecer na cidade californiana de São Francisco o novo documento da Carta das Nações Unidas durante a conferência fundadora da organização mundial, de que, aliás, viria a ser o primeiro secretário-geral, embora a título temporário.
Entretanto, também a cargo do espião soviético estaria o Departamento de Assuntos de Política e Segurança, incumbido da jurisdição das futuras operações militares da ONU. Contudo, é de notar que Alger Hiss, ao mesmo tempo que operava na esfera da espionagem soviética, actuava igualmente no âmbito da agenda da Sociedade Fabiana (3), pelo que assim se explica ter sido ora conselheiro do Presidente norte-americano Franklin D. Roosevelt, ora presidente do Carnegie Endowment Fund. Logo, eis a razão por que a ONU tenha, desde a primeira hora, procurado prosseguir e redireccionar a estratégia global colectivista já de alguma forma subjacente ao anterior projecto da Liga das Nações, projecto esse delineado pelo marxista Edward Mandell House (4), um dos fundadores do Council on Foreign Relations (CFR) (5), em 1921 (6), além de principal conselheiro do Presidente Woodrow Wilson, de 1913 a 1921.
Fora, aliás, uma delegação composta por vários membros (7) do CFR que estivera na base fundacional da Conferência das Nações Unidas sobre a Organização Internacional. Ora, a missão daquela delegação torna-se, pois, compreensível face ao desígnio supremo do que, para todos os efeitos, representa o CFR nos Estados Unidos: a constituição do governo mundial. Daí que essa organização, mormente constituída por inúmeros membros da maçonaria, seja financiada pelas fundações Ford, Carnegie e Rockefeller, ou ainda por trusts de renome internacional, tais como a IBM, a ITT ou a Exxon, que proviera, em 1972, da Standard Oil Company of New Jersey.
Variadíssimas têm sido, no decorrer dos últimos oitenta anos, as personalidades que nos EUA fizeram ou fazem parte do CFR, nomeadamente secretários de Estado, generais e almirantes, chefes de Estado-Maior e oficiais da Marinha, além de conselheiros para a Segurança Nacional, candidatos presidenciais e directores da CIA. Consequentemente, a coordenação destas forças tem sido, a todos os títulos, poderosíssima, se, de um modo geral, atendermos ao controlo comportamental resultante de operações psico-políticas destinadas à aceitação, por parte do público ignaro, de campanhas, programas e propaganda insidiosa provenientes do CFR. No fundo, essas operações processam-se nos Estados Unidos e, por extensão, em todo o mundo, a partir de uma rede complexa de instituições e organizações financiadas pelo dinheiro dos contribuintes, de que se destacam, a título de exemplo, as seguintes: RAND Corporation, Planning Research Corporation, Hudson Institute, International Institute for Applied Behavioral Sciences, Heritage Foundation e Brookings Institution – todas ademais supervisionadas e geridas pelo Stanford Research Institute (SRI), sedeado na Califórnia.
Elihu Root |
Quartel General do Council on Foreign Relations (CFR), em Nova Iorque. |
O estratagema das operações psico-políticas exige, simultaneamente, o esforço propagandístico veiculado por diversos grupos de especialistas académicos, que vão, por seu turno, influenciar a opinião pública por via dos meios de comunicação de massas, designadamente jornais, rádio, televisão, think tanks, indústria do entretenimento, etc. Ora, um tal esforço propagandístico à escala mundial pode, por exemplo, ser revelado mediante o apurado entendimento do que, na realidade, foram as exigências e as condições específicas geralmente ocultas do Plano Marshall, visto que, muito para além do preconizado auxílio à reconstrução económica da Europa devastada pela guerra, um tal plano fora, na sua essência, um instrumento exclusivamente elaborado para a americanização do Ocidente europeu (8). Deste modo, a par das exigências de liberalização do comércio e incremento da produtividade, chegara a subsistir toda uma actividade de bastidores em que se puderam articular as elites político-económicas europeias com as elites homólogas americanas, de que, aliás, resultariam grandes lucros e fundos consideráveis que permitiriam à Agência Central de Inteligência (CIA) financiar, entre outras actividades ilícitas, as de carácter político-partidário em países europeus, mais propriamente em França e na Itália (9).
Consequentemente, as origens do Plano Marshall encontram-se profundamente ligadas à política prosseguida e instituída pelo CFR, a começar nas reuniões que, em 1939 e à porta fechada, teriam tido lugar através de figuras-chave no Departamento de Estado, mormente as de William L. Clayton e George F. Kennan. Nisto, o objectivo, a curto prazo, seria a concertada substituição do Império Britânico pela hegemonia política e económico-financeira dos Estados Unidos no hemisfério ocidental. Daí que o plano do General Marshall, justamente aquando do seu discurso na Universidade de Harvard (10), em Junho de 1947, tivesse integrado as propostas de um estudo do CFR, intitulado Reconstruction on Western Europe (11).
Os Estados Unidos da Europa
No seguimento do Plano Marshall viria a Declaração Schuman de 9 de Maio de 1950, no âmbito da qual o ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Robert Schuman, proporia a criação de um organismo supranacional - a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) – que seria a primeira de uma série de instituições europeias transnacionais com vista a implementar um mercado comum do carvão e do aço entre os países fundadores – França, República Federal da Alemanha, Itália, Países Baixos, Bélgica e Luxemburgo. A Declaração Schuman estaria, portanto, na origem da primeira pedra que levaria à construção de um Super-Estado Europeu, pedra essa que, por seu turno, redundaria, em 25 de Março de 1957, ora na Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom), ora no Tratado de Roma, ou Comunidade Económica Europeia (CEE). E eis, assim, a unificação política não declarada, se bem que profundamente implícita na política económica comum consagrada ao futuro governo mundial.
Note-se, bem a propósito, que fora o internacionalista Jean Monnet, um dos “pais fundadores dos Estados Unidos da Europa”, quem efectivamente inspirara o Plano Shuman (12). Outrossim designado por “Pai da Europa”, o arquitecto francês do mercado comum principiara o seu percurso económico e diplomático dentro de altos círculos de poder britânicos, tornando-se, concomitantemente, numa figura grada e protegida dos internacionalistas anglo-americanos. Não admira, pois, que já na Conferência de Paz de Paris, Jean Monnet, na qualidade de assistente do ministro francês do Comércio e da Indústria, Etienne Clémentel, houvesse proposto uma nova ordem económica baseada na integração europeia, porém oficialmente rejeitada pelos Aliados em Abril de 1919.
Rigorosamente, três foram os homens que estiveram na origem da Comunidade Económica Europeia (CEE): Jean Monnet, o Conde Richard Nicolaus Coudenhove-Kalergi da Áustria e Józef Retinger. Por consequência, a CEE, entendida como o primeiro passo para a consecução de um Super-Estado Europeu, começara por ser cuidadosamente planeada nas reuniões do Grupo Bilderberg, cuja primeira reunião teria tido lugar em 1954, no Hotel de Bilderberg, perto de Arnhem, na parte oriental dos Países Baixos. De resto, as futuras reuniões entre ministros dos Negócios Estrangeiros da Europa teriam sido particularmente propostas por Józef Retinger (13) e o presidente do Grupo Bilderberg, o Príncipe Bernardo da Holanda.
Curiosamente, Jean Monnet fora filho de um comerciante francês de brandy. Mudou-se para o Canadá em 1910 em busca de novos mercados para o negócio de família, tornou-se confidente de presidentes e primeiros-ministros, foi Secretário-Geral da Liga das Nações, vice-presidente da empresa TransAmerica, conseguindo assim conquistar uma posição perfeita que lhe permitiria jogar em ambos os lados do Atlântico para a criação da Comunidade Económica Europeia (14). Entretanto, é também de assinalar que o Conde N. Coudenhove-Kalergi não só dera à estampa, em 1923, um livro intitulado Pan Europa, em que propunha a formação dos Estados Unidos da Europa (15), como propusera ainda que o Hino da Alegria de Beethoven fosse adoptado como Hino representativo da federação europeia.
Jean Monnet (1888-1979). |
Joseph Retinger à direita. |
Richard von Coudenhove-Kalergi |
Exército Europeu Único. Ver aqui |
Consequentemente, a criação de um Super-Estado Europeu implica necessariamente o fim das soberanias nacionais, especialmente patente nas leis que os burocratas não-eleitos de Bruxelas ditam e impõem aos Governos e Parlamentos nacionais. Aliás, não foi por acaso que alguns desertores do KGB, como Anatoly Golitsyn e Vladimir Bukovsky, se deram ao trabalho de mostrar a semelhança existente entre o sistema de corrupção inerente aos burocratas do Politburo da União Soviética e o sistema não menos corrupto que actualmente envolve os burocratas do europeísmo invasor. Bukovsky dissera, inclusive, que em 1992 tivera acesso aos documentos do Comité Central do Partido Comunista da União Soviética, que confirmavam o intento de transformar a Europa num Estado totalitário.
Em termos estratégicos globais, a criação de um Super-Estado Europeu integra-se numa Nova Ordem Mundial que inclui outros Super-Estados a serem criados em zonas específicas do planeta. Assim, teremos, a par da União Europeia, a União Americana, a União Africana (17) e a União Ásia-Pacífico. Ou seja: têm sido criadas novas "zonas de comércio livre" com vista a procurar fundir diferentes países ou plataformas regionais, pelo que têm surgido tratados como o North America Free Trade Agreement (NAFTA), que envolve os Estados Unidos, o Canadá e o México, ou fóruns como o Asia-Pacific Economic Cooperation (APEC), constituído por 21 países localizados no Círculo do Pacífico, ou ainda organizações como a Comunidade Económica Africana (CEA), que estipula a criação, entre Estados africanos, de uniões aduaneiras, um banco central, uma moeda comum, etc. Por outras palavras, a centralização do poder de decisão na Europa, nas Américas, África e Ásia-Pacífico processa-se em nome da "coordenação", da "cooperação" e da "associação" de múltiplos interesses, forças e actividades em jogo, mas que posteriormente evoluem para "uniões" ou "entidades" que possam garantir o objectivo final: a consolidação de um Governo Mundial com um Exército Único, um Banco Único e uma Moeda Única (electrónica, não em dinheiro). Em suma, o Reino do Anticristo.
O caso da União Europeia é, portanto, um caso paradigmático do que temos vindo a descrever, na medida em que já está praticamente consumada uma repartição da Europa em regiões administrativas controladas por comissários europeus não-eleitos, mais os seis membros do Quadro Executivo do Banco Central Europeu que controlam a moeda única e as reservas monetárias de cada "Estado". E, Portugal, como é óbvio, permanece actualmente subjugado à mega-estrutura tecnocrática da União Europeia, visto não haver governo em Terra de Santa Maria que não tenha cumprido, ao longo dos últimos trinta anos, as inúmeras ordens, normas e directrizes europeias que visam o completo desaparecimento da realidade histórica e espiritual que é Portugal. Aliás, um sinal significativo desta inversão civilizacional encontra-se na forma como os nossos maiores Monumentos Nacionais – Mosteiro dos Jerónimos, Torre de Belém, Mosteiro da Batalha e outras maravilhas de Portugal – passaram a ser classificados como Património Mundial da UNESCO, que é, como se sabe, uma das agências especializadas da Organização das Nações Unidas para a educação, a ciência e a cultura.
A “cultura unificada” da UNESCO e os “direitos humanos”
No livro que demos à estampa com o título de Noemas de Filosofia Portuguesa, notadamente consagrado a Um estudo revelador de como a universidade é o maior inimigo da cultura lusíada, já procurámos demonstrar qual o nexo existente entre a agenda internacionalista da UNESCO e o programa da “Disciplina de Filosofia” ensinado em Portugal. Assim, desde a vertente moralista, sociológica e não menos ideológica (18) decorrente desse programa, até à técnica predominantemente socialista inerente à “cultura unificada” da UNESCO, eis como, num capítulo designado por «A filosofia não é uma disciplina», delineámos as consequências contraproducentes de um ensino inteiramente subordinado aos ditames económicos, sociais e políticos de um sistema totalitário mundial. No entanto, abordemos agora o que, no quadro do mesmo programa, reforça e institui, em termos hegemónicos, a internacionalização do ensino tal como “sugerido” ou “recomendado” pela UNESCO.
Comecemos então por dar uma sinopse relativa ao que, em termos de «valores, diversidade e diálogo de culturas», os professores da “Disciplina de Filosofia” ensinam aos adolescentes para, em função de objectivos estritamente programáticos, proporcionarem o «desenvolvimento de um pensamento ético-político crítico, responsável e socialmente comprometido» (19). Em primeiro lugar, preconiza-se o multiculturalismo, entendido, por um lado, enquanto «descrição e análise das diferenças culturais entre povos que habitam regiões distintas do globo» e, por outro, firmado no pressuposto de, «num mesmo espaço social, pessoas com culturas diferentes terem de lidar umas com as outras» (20). Seguem-se, posteriormente, as várias atitudes face ao multiculturalismo ou diversidade cultural, a saber:
a) etnocentrismo, no qual subsiste a superioridade de uma cultura em relação às demais, daí resultando a xenofobia (ódio aos estrangeiros), o racismo (repúdio violento de determinados grupos étnicos) e o chauvinismo (patriotismo fanático);
b) relativismo cultural (21), no qual se advoga a «tolerância face às diferentes expressões culturais das outras comunidades», pese embora encerrando aspectos negativos como o isolamento ou a separação entre culturas, eventualmente expressa na proibição da entrada de imigrantes, e, portanto, na consequente estagnação ou visão estática de culturas tradicionalmente enraizadas;
c) interculturalismo, em que finalmente triunfa o diálogo entre culturas, além do indispensável compromisso na solução global dos problemas sociais, económico-políticos e ecológicos (22).
Posto isto, avancemos agora para a preconizada natureza universal dos “direitos humanos”, tal como genericamente postulada nos manuais da «Disciplina de Filosofia». Nesta matéria, vejamos, pois, o que nos têm para dizer David Stewart e Gene Blocker, em Fundamentals of Philosophy (Prentice Hall, 4.ª edição, 1966):
«Todos sabemos que há muitas maneiras de entender o que são direitos e vemos que variam de país para país e de cultura para cultura, Assim, propor direitos “humanos”, “universais” ou “morais” não é fácil. No entanto, foi o que a Assembleia-Geral da ONU propôs em 1948: estabelecer direitos aceitáveis e obrigatórios em todos os países, qualquer que seja a sua história, orientação religiosa e filosófica e quaisquer que sejam as circunstâncias políticas e económicas. Uma vez que pretendem ser independentes das tradições e das práticas culturais particulares, estão, por isso, acima do que cada país possa estabelecer sobre eles. É nesse sentido que se dizem universais e inalienáveis. Isto quer dizer que nenhum ser humano pode ser “expropriado” destes direitos porque, se assim fosse, ficaria privado do que a Assembleia da ONU definiu que todos os seres humanos possuem igualmente: dignidade» (23).
Ora bem: o que daqui prontamente resulta, tal como descrito nos manuais supracitados, é que a diferente noção sobre direitos legais ou morais decorrente de sistemas políticos, económicos, sociais e morais vigentes em cada cultura em particular, pode entrar em permanente conflito com uma outra noção consagrada à dignidade absoluta ou ao valor intrínseco do ser humano como fonte de todos os direitos humanos. Uma coisa são, portanto, direitos que resultam moral ou legalmente legitimados por uma determinada cultura, mesmo estando em causa a vida ou a liberdade da pessoa humana, e outra coisa são os direitos inalienáveis, invioláveis e imperecíveis atribuíveis a qualquer ser humano, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião. Daí que surja automaticamente justificada a Declaração Universal dos Direitos do Homem (24), adoptada pela Organização das Nações Unidas em 10 de Dezembro de 1948, na continuidade de outras grandes declarações que marcaram a cultura jurídica do Ocidente (25), nomeadamente a Declaração da Independência dos Estados Unidos, em 1776 (26), a Constituição dos Estados Unidos de 1787, ou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, em França.
Porém, é de notar que a concepção dos “direitos humanos” proclamados pela ONU, consagrada no princípio de que todos os homens são livres e iguais entre si (27), e, nessa medida, usufruem da mesma dignidade, remonta ao espírito iluminista firmado numa antropologia predominantemente naturalista, posto que liberta da concepção teocêntrica aristotélico-escolástica. Nisso, destituída a razão e a vontade divinas por conta da razão humana, eis que assim surge a respectiva fonte do Direito Natural, pretensamente universal e imutável, a cujo conhecimento todo o homem poderá ascender e extrair, por via puramente dedutiva, o conjunto ou sistema das suas leis. Aliás, com o aparecimento de um tal jusracionalismo resultaria ainda que, na negação, ausência ou privação de Deus, o Direito Natural existiria por decorrência directa, imediata e exclusiva da natureza puramente racional do homem (28).
Robert Muller |
De inspiração directamente kantiana tem sido, de facto, toda a legislação uniformizante que a ONU, desde a sua primeira hora, vem progressivamente instituindo e impondo ao mundo. E a complementar essa inspiração de ordem iluminista tem estado igualmente o positivismo jurídico de Hans Kelsen, para quem a teoria pura do direito corresponde a uma hierarquia piramidal de normas em que a primeira e fundamental de todas reside na primazia do direito internacional, no qual apenas subsiste a positividade dos ordenamentos jurídicos impostos por orgãos, poderes e instâncias que, sem nenhuma referência aos príncipios de verdade, justiça e liberdade, detêm o poder efectivo de lavrar códigos que reflictam, na esfera nacional, o que rigorosamente se estipula na ordem internacional. Noutras palavras, aqueles orgãos, poderes e instâncias traduzem-se sobretudo nas diversas agências que constituem a Organização das Nações Unidas, ou, se quisermos, na superpotência global e transnacional implícita nas concepções dogmáticas já teoricamente adoptadas por Manuel Kant e Hans Kelsen.
A «Disciplina de Filosofia» é, nessa matéria, bem explícita ao considerar que a simples existência de Estados que, à partida, se permitam não acatar, adoptar ou respeitar as normas e os direitos consagrados pela ONU, sujeitam-se imediatamente a serem acusados de violadores dos “direitos humanos” (29) e, por consequência, a serem prontamente julgados por tribunais internacionais cuja finalidade é, para todos os efeitos, perseguir todos aqueles que não adiram aos ditames da nova sociedade global (30). De modo afim, encontram-se os parlamentos nacionais submetidos à trama das vontades que se aglomeram em torno das organizações supranacionais, a começar pelos 28 comissários não-eleitos do orgão executivo da União Europeia, e a culminar nos burocratas das Nações Unidas e numerosas ONGs envolvidas na teia opressora da “lei internacional”. Entretanto, há até quem se tenha referido à face oculta da ONU (31), conforme nos informa Olavo de Carvalho (32), a quem, por seu turno, invocaremos com vista a uma melhor compreensão do que, visando a radical transformação da humanidade, significa a hodierna concentração do poder à escala mundial:
«Com grande freqüencia vejo liberais e conservadores repetindo os slogans mais estúpidos do globalismo, como por exemplo o de que certos problemas – narcotráfico, pedofilia, etc. – não podem ser enfrentados em escala local, requerendo antes a intervenção de uma autoridade global. O contransenso dessa afirmativa é tão patente que só um estado geral de sonsice hipnótica pode explicar que ela desfrute de alguma credibilidade. Aristóteles, Descartes e Leibniz ensinavam que, quando você tem um problema grande, a melhor maneira de resolvê-lo é subdividi-lo em unidades menores. A retórica globalista nada pode contra essa regra de método. Ampliar a escala de um problema jamais pode ser um bom meio de enfrentá-la. A experiência de certas cidades americanas, que praticamente eliminaram a criminalidade de seus territórios usando apenas seus recursos locais, é a melhor prova de que, em vez de ampliar, é preciso diminuir a escala, subdividir o poder, e enfrentar os males na dimensão do contato direto e local em vez de deixar-se embriagar pela grandeza das ambições globais» (33).
Na verdade, para que ocorra, no limite do possível, a concentração do poder mundial, torna-se indispensável a internacionalização do ensino. E quem melhor dá conta desse mesmo processo é, sem dúvida, Álvaro Ribeiro, sobretudo quando alude ao carácter predominantemente positivista e sociológico das publicações da UNESCO:
«A proliferação de estudos sociais e de estudos sociológicos, em todo o hemisfério designado por ocidental, com a multiplicação de gabinetes, centros, institutos, faculdades e outras escolas, acusa uma tendência doutrinária que me parece perigosa na medida em que tende a minimizar, ou a minorar, os estudos de psicologia. A sociologia sem psicologia conduz à inversão, e portanto à falsificação, dos métodos explicativos e racionais. Ora a UNESCO está impregnada deste sociologismo tão internacionalista como abstracto, contra o qual não podem deixar de opor-se todos os intelectuais religiosos e todos os intelectuais espiritualistas que meditem sobre o destino transcendente da Humanidade» (34).
Ora, retomando a pertinente questão dos “direitos humanos”, digamos, pois, que o referido «sociologismo tão internacionalista como abstracto» é, de facto, uma constante quando nos predispomos a percorrer a complexidade de estudos, comissões, projectos, sessões e grupos de trabalho destinados a formular, estabelecer e documentar os direitos e liberdades fundamentais do homem tal como ideologicamente estipulados pela Organização das Nações Unidas. E assim é porque, se numa primeira instância se nos afigura perfeitamente legítimo o reconhecimento, no homem, de certos direitos naturais cuja perpetuidade e inviolabilidade não têm um fundamento positivo (35), e, desse modo, não assentam numa ideologia com origem determinada num pernicioso instrumento de dominação internacional – como é o caso da ONU –, numa segunda instância parece-nos incrivelmente abusiva a tipologia infindável de direitos cujo imperativo categórico na ordem do direito internacional significa, acima de tudo, a imposição a todos os indivíduos e a todos os povos de uma nova e proclamada administração política, social e económica mundial. Dito de outra forma, estamos perante um falso e abstracto universalismo com origem determinada no mundo, por contraposição ao universalismo garantido na ordem da transcendência divina, e, por conseguinte, jamais subordinado a um certo instante do tempo e a um certo ponto do espaço (36).
A presumível universalidade subjacente aos direitos cívicos, políticos e económicos de que devem gozar, com base na organização jurídica prevista, todos os membros da sociedade global unificada, são, para darmos alguns exemplos, o direito de salário igual por trabalho igual, o direito ao repouso e aos lazeres, o direito à segurança social, o direito ao bem-estar numa sociedade democrática, o direito ao protesto pacífico e assim por diante. Aliás, a ficção jurídica decorrente dessa aparente e abstracta universalidade manifesta-se logo na evidente limitação, ausência ou inexistência do “gozo dos direitos” pressupostos nessa mesma universalidade, uma vez sabido que a sua virtualidade depende inteiramente dos recursos que, não obstante os apregoados mecanismos de cooperação internacional, cada Estado tem efectivamente ao seu dispor. Por isso, uma vez escassos ou insuficientes esses recursos (37), queda apenas um enunciado internacional dos "eternos princípios", em função do qual emerge, em claro sinal de regressão civilizacional, a eliminação já antevista de entidades reais intermediárias até há pouco tempo denominadas nações e pátrias.
«Nenhum povo – diz-nos ainda Álvaro Ribeiro – toma consciência de que está inferiorizado, de que se aceita como inferior, quando lhe dizem que ele será igual aos outros no dia em que deixar de seguir pelos caminhos que foram tradicionalmente os seus.
Abrindo as suas fronteiras a todas as influências doutrinárias, o povo inferiorizado acolhe de braços leais os estrangeiros, disposto a ouvir com séria reverência todas as lições dos conferencistas, as comunicações dos congressistas, as observações dos turistas, para concordar que, relativamente ao pormenor discutido ou discutível, está atrasado e precisa de convergir para o ideal universalista e uniformista. Em casos de maior hospitalidade, o povo disposto a aperfeiçoar-se convida o estrangeiro a exercer funções docentes no país, e mostra-se muito grato por tal favor. Eis que logo os estrangeiros se apressam a propor, e a impor, os seus sistemas de ensino, com métodos especiais para fins especiais, quer apresentando paradigmas que as novas escolas imitam, a fim de que os respectivos diplomas tenham validade internacional, quer organizando internatos e externatos pelos quais afastam os alunos das doutrinas tradicionalmente ensinadas pelos pais e pelos avós. Este processo de assimilação intoxica os povos que se consideram inferiores.
Estrangeiro, imigrante ou turista é quem não nos entende, embora possa chegar a falar e a escrever perfeitamente o português, como se fosse um nacional. Assim procede até a maioria daqueles que a crítica literária designa com o nome fugidio de ensaístas, porque, portadores de uma mentalidade exótica, são pródigos em tentativas de exprimir, comunicar e persuadir.
Depois das escolas, também as profissões hão-de ser submetidas à uniformização técnica já considerada de valor internacional, mas quantas vezes sem respeito pelo estilo e pela arte que deram grandeza ao povo, em obras que os mesmos estrangeiros adquirem para guardarem nos museus dos seus países. Desenhadores e pintores, que não estudaram os princípios tradicionais, permutam a subjectividade do estilo com a objectividade da técnica, e propõem à indústria os modelos mais feios, mais contrários às elementares condições do comércio.
Esta organização internacional dos mesteres, dos ofícios e das artes, com seus congressos legislativos e executivos, aparece maculada por um espírito de classe que em tudo se opõe à alma nacional. Na convicção que do estrangeiro surgem os produtos industriais de maior perfeição técnica, entram por cima das alfândegas e das fronteiras, em franco trânsito liberal, milhares de coisas portadoras de sinais opostos e de valores contrários tanto à cultura tradicional do país como ao estilo próprio do povo. Não observam os ingénuos que no comércio internacional se opera uma das formas mais subtis de incursão e de invasão por denominador comum, e só ficam alarmados quando comparam os números da importação e da exportação, ou traduzem esses números para valores da moeda nacional» (38).
Por estrangeiro subentenda-se, na propriedade terminológica alvarina, o que é estranho à cultura e às virtudes do povo português. E já, agora, não se aponte, nas sobreditas palavras de Álvaro Ribeiro, para o contexto temporal em que foram patrioticamente escritas, uma vez que a argumentação tradicional que por elas espiritualmente perpassa supera a fundamentação histórico-geográfica, porque justamente conferida pela significação filosófica realizada em nome de Portugal. E assim sendo, também em nome do mundo em forma armilar.
Todavia, eis que, a par da implantação de uma arquitectura mundial regida por uma gama infindável de declarações, “sugestões” e medidas draconianas proferidas e implementadas por grupos de peritos internacionais, temos já perante nós aquele arrepiante cenário forjado no plano descendente dos “novos direitos humanos”, frequentemente discutidos e, alfim, aprovados na sede nova-iorquina das Nações Unidas. Referimo-nos, como é óbvio, ao aborto, à eutanásia e à panóplia de pseudo-definições contidas na vulgarmente denominada “identidade ou ideologia de género” (39). Consequentemente, estes “novos direitos humanos” já constituem, de per si, uma cabal distorção da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, visto comprometerem o sentido ético e antropológico dos direitos naturais do homem ainda formalmente presentes naquela mesma Declaração.
Ora, uma vez delineada como «ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações», uma tal Declaração, a partir do momento em que, absurda e inusitadamente, inclua aqueles “novos direitos humanos” que nunca couberam ou poderiam caber na noção formalmente racional dos direitos naturais do homem, limita-se apenas a ser um documento de direito positivo arbitrariamente inventado. Depois, nessa condição pouco ou nada atendida por quem de direito, eis que surge mais uma nova versão de “direitos humanos” que, no que imoralmente implicam, exigem e proclamam, subvertem os mais altos princípios éticos e espirituais dos diferentes povos, nações e culturas em vias de extinção. Entretanto, toda a nação que doravante se atreva a recusar os “novos direitos” da humanidade dolorida, terá, pois, que se haver com uma jurisdição permanente universal cujo móbil seja, em termos sobejamente exemplares, condenar e punir as supostas “infracções” à emergente “cultura da morte”.
A Igreja Católica e a nova arquitectura mundial
Infelizmente, a Igreja Católica tem-se mostrado, em várias e determinadas ocasiões, incapaz de lidar convenientemente com a transgressão maligna dos direitos naturais do homem. Logo, se, por um lado, atendermos à eleição do Patriarca de Veneza, Albino Luciani – o “Papa do Sorriso”, também conhecido por João Paulo I (40) –, que estaria, possivelmente, na base de uma abertura da política do Vaticano ao controlo da natalidade (41) conforme prescrito pelo Fundo Populacional das Nações Unidas (42), e, por outro lado, transitarmos à exortação feita pelo Papa Bento XVI no sentido de ver reconhecida «uma verdadeira Autoridade política mundial, delineada já pelo [seu] predecessor, o beato João XXIII» (43), é então caso para afirmar que estamos, de facto, perante uma convergência multilateral de esforços com vista a uma interdependência global inédita na história da humanidade. E inédita porque inevitavelmente totalitária, não obstante ser-nos frequentemente apresentada em nome do bem comum decorrente da estrita observância dos princípios de subsidiariedade e solidariedade.
Com isto, não queremos, de modo algum, dizer que existe duplicidade ou má-fé por parte da Igreja Católica, embora já o mesmo não possamos admitir, por tudo o que temos visto até aqui, quanto às forças, poderes e entidades que estão na origem e no ulterior desenvolvimento da ONU. No caso de Bento XVI, «a urgência de uma reforma, quer da Organização das Nações Unidas, quer da arquitectura económica e financeira internacional», significa o seguinte: num primeiro plano, que diríamos puramente académico, Bento XVI limita-se a tecer puras considerações abstractas sobre um hipotético mundo que não existe nem jamais existirá no contexto da globalização em curso, principalmente ao apelar «para que seja possível uma real concretização do conceito de família de nações»; num segundo plano, Bento XVI, por mais incrível que pareça, mostra ignorar que a arquitectura mundial hodierna, nas suas mais complexas e fundas conexões, busca precisamente a eliminação de toda e qualquer nação enquanto elemento naturalista que apela para a vinculação espiritual à Pátria. Por outras palavras, a sua não inteira compreensão de como efectivamente actuam, na ordem terrena, os poderes das trevas, revela uma profunda ironia relativamente a quem, questionado sobre a obra da Igreja na sua relação com o destino de Cristo, invocara as inquietantes palavras do Filho de Deus: «Envio-vos como ovelhas para o meio dos lobos», e «sereis perseguidos» (44).
Neste ponto, ficamos até com a impressão de que a Igreja Católica está, infelizmente, condenada a prosseguir por aquela linha de transformação revolucionária que, na senda do Vaticano II, alterou, decerto, a substância dos seus ritos, da sua liturgia e do seu património doutrinal. No fundo, é a concomitante convicção de que a reforma das verdades da fé e, por consequência, a da sociedade temporal, colocará a Igreja na vanguarda das grandes transformações políticas, económicas e culturais, para assim poder, em espírito de contradição com a Doutrina Católica e a Revelação Divina, adaptar-se às vicissitudes incertas, fugazes e caducas da presente temporalidade. Numa palavra, é o aggionarmento enquanto objectivo central do Vaticano II, que consiste na “actualização” ou “modernização” da Igreja Católica em vista de um preconizado ecumenismo (45) que, no seu decurso, tem já procedido à dessacralização do sacerdócio, bem como à crença de que mundanas formas da democracia parlamentar são adequadas para a participação alargada na vida eclesiástica, na Igreja universal, nas dioceses e nas paróquias.
Paulo VI nas Nações Unidas |
Apesar de tudo, seria o Papa Paulo VI quem praticamente consolidaria esta etapa evolutiva e transformativa da Igreja Católica Romana, para o que não fora certamente alheio o seu percurso enquanto substituto da Secretaria de Estado do Vaticano. Aliás, quando ainda jovem, teria sido «chamado à Secretaria de Estado e nomeado assistente eclesiástico da FUCI (Federação Universitária dos Católicos Italianos), uma actividade que o ocupou intensamente, mas da qual foi afastado pela orientação que deu à formação dos jovens, em especial pela sua concepção litúrgica “inovadora” e por uma acentuada tendência para a “politização” dos jovens» (46). Seja como for, tratemos de ver, ainda nas palavras de Roberto de Mattei, quais foram as notadas suspeitas que rodearam a sinistra figura de Giovanni Battista Montini, uma vez nomeado, em 1954, arcebispo de Milão, «embora sem o chapéu cardinalício»:
«A promoção foi, na realidade, uma “despromoção”, cujos motivos ainda hoje não são claros. Segundo alguns, Mons. Montini esteve envolvido na traição do Padre Alighiero Tondi (47); de acordo com o Cardeal Siri, foi enviado para Milão na sequência do juízo negativo de uma comisão secreta criada por Pio XII que tinha perdido a confiança no substituto pelo facto de este proteger o presidente da Acção Católica, Mario Rossi, que se batia por uma Igreja empenhada à esquerda; por sua vez, o Cardeal Casaroli confiou a Andrea Tornielli que as relações do Papa com o seu principal colaborador “começaram a deteriorar-se substancialmente devido aos contactos de Montini com os ambientes da esquerda da política italiana, estabelecidos sem o conhecimento de Pio XII”. Do epistolário de Mons. Montini com o Padre Giuseppe de Luca pode concluir-se que, através do sacerdote romano, o substituto mantinha contactos com os católicos comunistas e com alguns sectores do PCI. Por sua vez, Andrea Riccardi recorda que algumas nomeações de bispos da Lituânia, feitas de maneira “senão misteriosa, pelo menos nebulosa”, tinham dado lugar a boatos sobre infidelidades de Montini nas questões soviéticas, boatos que remontam a um “relatório secreto” de Claude Arnould, coronel francês católico e anticomunista, que tinha sido encarregado de investigar a passagem de informações reservadas da Secretaria de Estado aos governos comunistas do Leste. Arnould tinha atribuído a origem das fugas a Mons. Montini e à sua entourage, lançando o alarme no Vaticano. Andrea Tornielli trouxe à luz alguns documentos que parecem provar a credibilidade de Arnould, o qual gozava da total amizade e confiança do Cardeal Tisserant e circulava nos níveis mais elevados do Estado e da Igreja em França» (48).
É sabido que Paulo VI, referindo-se à crise espiritual da Igreja, descrevera a existência de «dúvidas, incertezas, problemáticas, inquietações, insatisfações e confrontos» mediante a «sensação de que o fumo de Satanás entrou dentro do templo de Deus por alguma fissura». Porém, se atendermos ao discurso que Paulo VI proferira, a 5 de Outubro de 1965, na Organização das Nações Unidas, no decorrer do qual elogiou a instituição globalista como o «ideal com que a humanidade sonha através da sua peregrinação no tempo», ele próprio daria, sem dúvida, um excelente acólito de Satanás. Além disso, Paulo VI diria ainda que a ONU era parte do «desígnio de Deus», o que não seria de estranhar numa criatura para quem entregar museus e palácios do Vaticano à UNESCO significava um preconizado afastamento em relação às riquezas deste mundo.
Curiosamente, costuma dizer-se que os Cavaleiros da Ordem do Templo teriam acumulado uma grande riqueza cobiçada pela ambição de Filipe, o Belo, o qual, conjugado com o Papa Clemente V, ter-se-ia apropriado dessa riqueza mediante a condenação dos Templários. Todavia, a questão parece não ser simplesmente de ordem material, mas antes e, acima de tudo, de natureza profundamente espiritual, se, no presente caso, atendermos ao projecto fundamental da Ordem do Templo, que seria a constituição de um império universal teocrático justamente assente na transformação secreta das principais estruturas históricas do seu tempo. É, de resto, interessante a forma como Juan G. Atienza, sondando a história oculta do templo na Idade Média Peninsular, reconhece como um tal projecto acabaria por implicar, da parte dos poderes então constituídos – reinos, monarquias e Igreja Católica –, a condenação e abolição da Ordem Templária que, no fundo, mais não seria do que a condenação e abolição de um poder universal realizável a longo prazo. Eis as suas palavras:
«Poderíamos, por acaso, imaginar, aqui e agora, as intenções reais de organizações como a CIA, de certas seitas integralistas ou de algumas empresas multinacionais, sem despertar um sentimento generalizado de protesto e recusa perante o que poderia determinar o fim definitivo e irreversível de estruturas que cremos que nos regem? Não existe a menor dúvida, e hoje mesmo estamos a vivê-lo na nossa história próxima, de que o mundo subsiste imerso em corporativismos de todo o tipo, através dos quais as diversas classes sociais se imaginam protagonistas do seu próprio devir. Se estas classes, aparentemente autóctones, forem ameaçadas com a aniquilação em nome de uma suposta ordem universal, que necessariamente anularia de raiz os pequenos poderes nacionais, gremiais, institucionais e políticos, sobre os quais se estruturam os nossos projectos existenciais e políticos, podemos estar seguros de que todas, ou a maior parte delas, se uniriam para que tal eventualidade nunca se tornasse possível» (49).
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É, todavia, um facto que deparamos, na actualidade, com uma realidade profundamente hostil ao firmamento espiritual da Cristandade, ademais operativa nalguns círculos da Santa Sé, como, aliás, convém ao globalismo invasor. Nesta base, comecemos, pois, por referir o rol de figuras que começaram a frequentar a Casina Pio IV (52), entre as quais surgem líderes de organizações não governamentais, especialistas universitários, economistas, sociólogos, informáticos, consultores políticos e tutti quanti. E, na sequência disso, ponhamos, por alguns momentos, toda a nossa atenção na organização de um worshop no Vaticano intitulado O Tráfico de seres humanos: uma escravatura moderna, realizado a 2 e 3 de Novembro de 2013, em colaboração com a Academia Pontifícia das Ciências e a Academia Pontifícia das Ciências Sociais.
Em primeiro lugar, ficámos a saber, através de Nello Scavo, que o Papa Bergoglio, por ocasião do citado workshop, estaria particularmente a par dos conteúdos e da finalidade do que ali fora debatido e declarado, sendo até, «segundo se confirma da Casina Pio IV, “o elemento principal”» (53). Em segundo lugar, ficámos também a saber que a necessidade de suprimir o tráfico de seres humanos em todas as suas formas, nomeadamente o tráfico para fins de exploração sexual e de prostituição, constitui um objectivo a ser essencialmente perseguido na ordem do direito internacional, a que estarão submetidos todos os líderes do mundo. Em terceiro lugar, foi-nos, entretanto, dado a conhecer, com base num documento final aprovado pelos estudiosos convocados pela Academia Pontifícia das Ciências Sociais, um primeiro elenco de “sugestões” expressamente dirigidas ao Vaticano para que assumisse como imperativo moral «tornar a nossa geração na última que tenha de combater o comércio de vidas humanas». Vale, pois, a pena transcrevê-las aqui, para melhor intuirmos como a Santa Sé se está a deixar comprometer numa rede infindável de convenções, tratados e protocolos internacionais que, para todos os efeitos, já concentram, de facto, a multiplicidade de poderes nacionais e locais num poder mundial iminente:
«1. Que [a Santa Sé] assine e ratifique a Convenção da ONU de 1949 para a repressão do tráfico de seres humanos e da exploração da prostituição;
2. Que assine e ratifique o Protocolo da ONU de 2000 sobre a prevenção, supressão e perseguição do tráfico de seres humanos, particularmente de mulheres e crianças (“Protocolo de Palermo”);
3. Que ratifique a Convenção do Conselho da Europa de 2005 sobre a luta contra o tráfico de seres humanos;
4. Que se empenhe para que as Missões permanentes da Santa Sé junto das organizações internacionais insistam na urgência de uma estratégia global contra o tráfico de seres humanos [o negrito é de nossa autoria];
5. Que encoraje a ratificação da Convenção Internacional sobre a Protecção dos Direitos dos Trabalhadores Migrantes (18 de Dezembro de 1990) e a Convenção sobre o Trabalho Digno para as Trabalhadoras e os Trabalhadores Domésticos da OIT (16 de Junho de 2011) e recomende a inclusão dos trabalhadores domésticos e agrícolas nas normas sobre o trabalho a nível nacional;
6. Que promova um movimento que assegure o empenho da Igreja Católica e de todos os homens e mulheres de boa vontade em deter o tráfico de seres humanos e a prostituição; isto deve ser afirmado nos termos mais claros e decisivos que lhe seja possível;
7. Que encoraje as ordens religiosas masculinas a colaborar com as ordens religiosas femininas para aliviarem imediatamente o sofrimento das vítimas de tráfico e, a longo prazo, a sua exclusão social» (54).
Casina Pio IV |
Aqui, o ponto essencial não é, como afirma Nello Scavo, tratar-se de uma simples «proposta que fará torcer o nariz aos liturgistas do dogma da privacidade». É, antes de mais, a criação de uma base mundial de dados genéticos a partir da qual decorre o controlo de elementos ou “núcleos da personalidade” equiparados a tantos outros dados de origem biológica. Esta questão ultrapassa, portanto, o mero debate académico sobre a necessidade de se proteger todos os princípios éticos e jurídicos relativos à privacidade das pessoas, uma vez que, face à unificação tecnológica dos vários e infindáveis aspectos da vida humana à escala mundial, tudo será disposto para monitorar e identificar pessoas na base de outros fins que não os previamente estabelecidos, venham eles sob a designação do combate ao tráfico de seres humanos, à criminalidade e ao “terrorismo” (56). Apesar disso, combater tais males na esfera da cooperação internacional poderá ser naturalmente legítimo, desde que estejam preservadas as esferas de autonomia e autoridade nacionais que estão na base da independência e da soberania dos povos.
Notas:
(1) É neste âmbito que assume particular relevância o projecto estritamente confidencial denominado War and Peace Studies, financiado pela Fundação Rockefeller.
(2) Alger Hiss foi acusado de ser um espião soviético a 3 de Agosto de 1948, e condenado, por perjúrio, a 5 anos de prisão, a 25 de Janeiro de 1950. Ainda antes da condenação de Alger Hiss, o Presidente Harry Truman chegara a receber informação fidedigna de que a sua Administração estaria infiltrada de agentes soviéticos. Aliás, em 1945, já J. Edgar Hoover avisara o Presidente de que Harry Dexter White, um alto funcionário do Departamento do Tesouro, passara segredos de Estado para a União Soviética durante a II Guerra Mundial.
Por sua vez, a Administração de Franklin D. Roosevelt estava tão minada de agentes soviéticos que Duncan Lee, o assistente pessoal do director do Office of Strategic Services (OSS), William J. Donovan, espiava igualmente para o maior inimigo dos Estados Unidos. E, no lance, FDR ordenara que se entregasse à embaixada soviética um manual de código da polícia secreta da URSS (NKVD), obtido pelo Office of Strategic Services (OSS). Não é, pois, de admirar que persistissem centenas de espiões soviéticos no governo americano e nem um único agente da OSS em Moscovo.
Todavia, estes factos continuam, especialmente dentro mas também fora dos Estados Unidos, a serem escamoteados pelo establishment universitário e mediático. E, em contrapartida, patriotas como Whitaker Chambers, o senador Joseph McCarthy e J. Edgar Hoover permanecem alvo de chacota e fundo desprezo em virtude de terem procedido contra a penetração comunista soviética em toda a sociedade norte-americana e seu respectivo governo.
(3) A Sociedade Fabiana, fundada a 4 de Janeiro de 1884, deve o seu nome ao cônsul romano Quinto Fábio Máximo, o Cunctator, que significa “Lento”, “Precavido” ou “Retardador”. Assim, nas palavras de F. Podmore: «É preciso saber esperar pelo momento oportuno, como Fábio pacientemente fez na sua luta contra Aníbal, apesar das críticas que recebeu pela sua lentidão. Quando chegar o momento, será necessário atacar como fez Fábio».
Quanto ao objectivo desta sociedade, cujas bases teóricas foram definidas nos Fabian Essays in Socialism (1889) por George Bernard Shaw, Sydney Webb e Annie Besant, entre outros, consiste ele no triunfo do socialismo internacional mediante a dominação dos meios de comunicação globalmente influentes, assim como na formação de quadros e criação de centros em múltiplas universidades de prestígio mundial, entre as quais se destacam as de Oxford, Cambridge, Harvard, Princeton e Columbia. Além disso, entre as suas criações mais representativas estão, por um lado, a célebre e influente London School of Economics, fundada em 1895, e, por outro, o Partido Trabalhista, fundado em 1906, devido ao fracasso resultante da tentativa de alcançar o socialismo dentro dos partidos até então tradicionais na Grã-Bretanha. No mais, a táctica gradual e subversiva da Sociedade Fabiana nos domínios da legislação e da propaganda política não fora impeditiva das boas relações com Lenine e Trotsky, bem como no apoio à Frente Popular durante a Guerra Civil de Espanha.
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(4) O texto ou documento subjacente a este projecto fora apresentado algumas semanas depois da abertura da Conferência de Paz de Paris, que se prolongara de 18 de Janeiro de 1919 a 20 de Janeiro de 1920. Esta Conferência contara com a presença de 70 delegados representando 25 países, pelo que o principal documento produzido fora efectivamente o Tratado de Versalhes, assinado a 28 de Junho de 1919, no qual constavam os termos da paz impostos às nações derrotadas.
(5) O CFR, cujo quartel-general encontra-se sedeado em Nova Iorque, é uma “ramificação” do Royal Institute of International Affairs (RIIA), instituído em Londres, em 1919, e também designado por Chatham House. A organização do RIIA, realizada no contexto da Conferência de Paz de Paris, principalmente aquando de um jantar no Hotel Majestic, no qual participaram poderosos grupos da finança, da indústria e do establishment universitário, esteve a cargo de uma delegação de peritos ingleses e americanos liderada por Lionel George Curtis, um dos arquitectos, com Alfred Milner, de uma rede de organizações – o Round Table movement (1909) - apostada numa estreita união entre a Inglaterra e suas possessões ultramarinas. No seu livro de 1938, The Commomwealth of God, Curtis advogara a criação de uma federação imperial britânica propensa a anexar os Estados Unidos, e, nessa medida, convenientemente apresentada às igrejas protestantes do Novo Mundo como fazendo parte de um desígnio da obra de Deus. Segundo Curtis, esta federação imperial britânica seria a estrutura de base para a implementação de um governo mundial.
De resto, The Round Table: The Commonwealth Journal of International Affairs, inicialmente subintitulado A Quarterly Review of the Politics of the British Empire, fora especialmente fundado, em 1910, pelo então ex-Alto-Comissário da África do Sul, Lord Milner, e seus associados: Lionel Curtis, Philip Kerr e Geoffrey Dawson. Aliás, a superioridade que Lord Milner imputava à raça anglo-saxónica supunha, antes de mais, uma aristocracia convicta da sua inteligência e poder criador quanto ao desenvolvimento dos assuntos da humanidade, e, portanto, inteiramente devotada à salvaguarda de princípios e valores profundamente estranhos a classes e populações analfabetas, quando não mesmo à democracia que lhes estaria eventualmente subjacente. Logo, assim se explica que Milner, Primeiro Vigilante da Grande Loja Unida de Inglaterra e membro de uma ordem de cavalaria bretã – a Nobilíssima Ordem da Jarreteira -, se apresentasse como um nacionalista apostado na posição insular britânica fortemente imperialista.
Convém relembrar que também John Ruskin, um crítico de arte inglês que exercera profunda influência em Cecil John Rhodes na Universidade de Oxford, advogara a necessidade de existirem alguns homens cuja superioridade se impunha em relação aos demais. Daí o seu ideário relativo a uma elite ou classe dirigente apta a governar sob os auspícios de um socialismo autocrático inspirado na República de Platão e nos escritos de Marx, Engels, Proudhon e Saint-Simon. E daí igualmente o projecto não menos autocrático do seu discípulo, Cecil Rhodes, que consistira na subordinação de todos os povos do mundo a uma federação dos povos de língua inglesa.
Compreende-se assim que o magnata, colonizador e homem de negócios britânico – além do mais um dos principais fundadores da companhia envolvida na mineração e comércio de diamantes, a célebre De Beers, originalmente financiada por Lord Rothschild e Alfred Beit –, deixasse uma parte considerável da sua fortuna para a realização daquele projecto que pressupunha, inclusive, a construção do caminho-de-ferro que ligaria o Cairo, no Egipto, ao Cabo, na África do Sul. Por conseguinte, a Rhodes Scholarship é precisamente a designação da bolsa de estudo que, no fundo, permitiria, na visão do seu patrocinador, salvaguardar a classe dirigente inglesa na sua passagem de testemunho a todos os povos do mundo. Por outro lado, tendo ainda sido membro de uma loja maçónica integrada na Universidade de Oxford – a Apollo University Lodge N.º 357 –, Cecil Rhodes aproveitaria esta sua experiência para superar ou colmatar as insuficiências da maçonaria inglesa mediante a criação, em 1891, de uma sociedade secreta destinada a fazer prevalecer o domínio britânico sobre o resto do mundo – a mesma que estaria na base do já referido Round Table movement, arquitectado por Lionel Curtis e Alfred Milner.
(6) O CFR começou por estar intimamente ligado aos Rockefeller, Morgan, Aldrich, Baruch, Warburg e Lippmann, a principal elite de banqueiros internacionais que estivera na origem, em 1913, do estabelecimento da Reserva Federal dos Estados Unidos. Quanto aos propósitos dessa elite na intrumentalização de guerras com vista a um governo totalitário mundial, aconselha-se vivamente a leitura do livro de G. Edward Griffin, The Creature from Jekyll Island, publicado em 1994. Aliás, um outro factor que, a seu modo, estaria ainda na origem do CFR, perfilar-se-ia, em 1917, num grupo de académicos de Nova Iorque ao qual fora especialmente solicitado, pelo Presidente W. Wilson, um variado leque de opções para a política externa estadunidense. Assim, originalmente aberto a estudiosos e diplomatas anglo-americanos, alguns dos quais pertencentes ao Movimento da Távola Redonda, aquele grupo de académicos daria lugar, em Junho de 1918 e por intermédio do secretário de Estado americano Elihu Root, a um aglomerado internacionalista constituído por 108 industriais, advogados e homens da banca que, por fim, culminaria, em 1921, no CFR.
(7) Entre estes membros contavam-se, por exemplo, Harold Strassen, Nelson Rockefeller, John Foster Dulles, Dean Acheson e o futuro arquitecto do Fundo Monetário Internacional (FMI), Harry Dexter White.
(8) Uma das críticas inicialmente feitas ao Plano Marshall, especialmente da parte do senador Robert Taft do Ohio, entre outras personalidades ligadas à ciência económica não-intervencionista, era a de que um tal plano iria necessariamente forçar os contribuintes americanos a pagar e subsidiar as políticas socialistas levadas a cabo por governos europeus, tais como a nacionalização de indústrias, o planeamento central, o controlo de preços e salários, restrições comerciais, excesso de regulação, desvalorização monetária, enfim, tudo o que a Europa jamais precisava a fim de poder recuperar de uma guerra devastadora.
Pese embora bem orquestrado nos termos de uma operação humanitária destinada a aliviar a fome, o sofrimento e a devastação causadas pela guerra, o Plano Marshall, também conhecido como Programa de Recuperação Europeia, acabaria assim por suscitar enormes obstáculos no Congresso dos Estados Unidos, em razão do ónus atribuído aos contribuintes americanos. Não obstante, um expediente fora oportunamente encontrado para levar avante um tal Programa de Recuperação Económica: a imperiosa necessidade de proteger a Europa Ocidental da ameaça comunista. E eis que, no lance, nascia a Doutrina Truman, apostada em defender o mundo livre da expansão do comunismo.
Como tal, o expediente surtiu grande efeito, permitindo que fossem aprovados pelo Congresso cerca de 13 biliões de dólares para o Plano Marshall, complementado por outras dezenas de milhares de milhões para inúmeros programas de reconstrução económica na Europa. Só entre 1945 e 1953, estiveram em jogo mais de 43 biliões de dólares que o Governo dos Estados Unidos canalizou para o Velho Continente, onde vingou o socialismo mediante inúmeros programas governamentais e monopólios estatais que assim engoliram os fundos astronómicos disponíveis.
(9) Os serviços secretos dos EUA foram, em grande medida, responsáveis pela usurpação da autonomia económico-política das soberanias nacionais da Europa. O respectivo intuito estivera, portanto, na criação de uma “União Atlântica” resultante de uma fusão entre a Europa e os Estados Unidos, mais recentemente impulsionada aquando das negociações, em Julho de 2013, referentes ao Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP). Como tal, foi Washington que sempre estivera na base da integração europeia desde finais de 1940, dado tê-la secretamente financiado sob as Administrações de Truman, Eisenhower, Kennedy, Johnson e Nixon.
Os “Estados Unidos da Europa” foi também um projecto da Agência Central de Inteligência (CIA), embora já anteriormente preconizado pelo Office of Strategic Studies (OSS), que fora, de sua banda, o serviço de inteligência precursor do Central Intelligence Group (CIG), estabelecido pelo presidente Truman, a 22 de Fevereiro de 1946, e finalmente convertido na CIA vinte meses depois. Aliás, não fora por acaso que o antigo responsável do OSS, o General William J. Donovan, tenha, de facto, assinado um memorando que seria desclassificado em 1950, onde se detalham as instruções para a criação de um “Parlamento Europeu” a impor aos povos e nações da Europa. Além disso, os serviços secretos americanos, em estreita colaboração com o Departamento de Estado, também se articulariam e trabalhariam intensamente para que a Inglaterra, desde sempre orgulhosa da sua independência nacional, se tornasse parte da futura confederação europeia.
A 4 de Julho de 1962, o Presidente Kennedy, retomando e prosseguindo a agenda globalista, referir-se-ia à projectada “União Atlântica” nos termos que se seguem: «Direi aqui e agora, em pleno Dia da Independência, que os Estados Unidos estarão prontos para a Declaração da Interdependência, e que nós estaremos preparados para discutir com a Europa unida os meios e caminhos aptos a formar uma Aliança Atlântica efectiva, mutuamente benéfica para a nova união agora emergente na Europa e a velha União Americana». E mais adianta: «O Acordo Atlântico de que falo não se configura apenas a si próprio, à sua acção social e progresso. Deverá antes projectar-se em cooperação com todas as nações que partilham preocupações em comum. Deverá assim tornar-se num núcleo para a eventual união de todos os homens livres – dos que já o são e de todos aqueles que esperam vir a sê-lo».
(10) Ainda antes de ter proferido o seu discurso na Universidade de Harvard, o General Marshall enviara os seus assistentes W. L. Clayton e George F. Kennan (CFR) para acertar linhas de rumo com Jean Monnet.
(11) Líderes desse estudo, datado de 1946, são o advogado Charles M. Spofford e David Rockefeller.
(12) O Plano Shuman deu imediatamente lugar ao elogio dos internacionalistas americanos. “Brilhantemente criativo”, assim o designara John Foster Dulles.
(13) Retinger possuía o Grau 33 na maçonaria sueca.
(14) Jean Monnet chegara a ter uma relação próxima com Harry Hopkins, o braço direito do presidente americano F. D. Roosevelt. Admirador do comunismo, Hopkins desempenhara um papel crucial na formulação da política pró-soviética na Administração Roosevelt, que tão desastrosa se tornara para os Estados Unidos e o Ocidente. Tendo jamais sido um crítico do comunismo, Jean Monnet conjugara esforços com Harry Hopkins para, nos bastidores, proceder às negociações do programa americano lend-lease, uma operação que consistira na canalização de dinheiro e material de guerra para a URSS, além do nuclear que doravante permitiria aos soviéticos o desenvolvimento da bomba atómica.
(15) O plano do Conde N. Coudenhove-Kalergi consistira num esquema destinado ao triunfo do socialismo na Europa. Para o efeito, o Conde austríaco fundara, em 1923, a União Pan-Europeia para assim lançar o movimento de unificação europeia. Entre os seus membros, destacar-se-iam Albert Einstein, Thomas Mann, Konrad Adenauer, Charlles de Gaule, Sigmund Freud, Benedetto Croce, Léon Blum e Georges Pompidou.
Já no final dos anos 20, eram várias as ramificações da União Pan-Europeia a operar através de Inglaterra e do Continente europeu. E tudo decorria com o apoio de vários líderes e estadistas europeus, bem como mediante o patrocínio do establishment anglo-americano. Nisto, até Winston Churchill, um apologista da Pan Europa de Coudenhove-Kalergi, escrevera, a 15 de Fevereiro de 1930, no Saturday Evening Post, um ensaio intitulado The United States of Europe, para, desse modo, suscitar o apoio do público americano quanto à ideia-motriz da unificação europeia.
As origens do Movimento Europeu Internacional datam de Julho de 1947, quando a causa da Europa Unida estava sendo promovida por Duncan Sandys, o genro de Winston Churchill. Este movimento – que seria oficialmente criado a 25 de Outubro de 1948 e prontamente financiado pela CIA através do American Commitee on United Europe – convocaria, de 7 a 11 de Maio de 1948, em Haia, o Congresso da Europa, consolidando assim a primeira etapa imprescindível à construção do federalismo europeu. Embora reunindo figuras importantes do espectro político mundial, tais como Winston Churchill, Konrad Adenauer, Harold Macmillan, Bertrand Russel, Paul Henri-Spaak, Alcide De Gasperi e François Mitterrand, quem, na verdade, geria o processo nos bastidores era basicamente Jean Monnet, acompanhado do misterioso polaco socialista, Joseph Retinger. Ora, das sete resoluções de política comum adoptadas no Congresso da Europa, a última declarava o seguinte: «A construção de uma Europa Unida deverá ser considerada como um passo essencial à formação de um Mundo Unido».
Seria ainda durante o Congresso da Europa que diversas personalidades, entre as quais Salvador de Madariaga, Winston Churchill, Paul Henri-Spaak e Alcide De Gasperi, proporiam a criação de um Colégio da Europa, especialmente destinado à formação de uma elite de eurocratas. Este instituto universitário, sedeado em Bruges, na Bélgica, passaria então a representar na elite política europeia o que a Harvard Business School representa entre as grandes corporações americanas. E, nesta senda, surgiria posteriormente o Centro Europeu de Cultura, inaugurado em Genebra, a 7 de Outubro de 1950.
Denis de Rougemont |
Inteiramente consagrado ao Centro Europeu de Cultura, esteve o escritor suíço Denis de Rougemont, cujo pensamento traçara, sob o influxo do movimento personalista, as grandes linhas-mestras de uma cultura europeia comum centrada na singularidade da pessoa humana. Adepto do federalismo europeu – numa perspectiva de diálogo e compreensão intercultural –, o autor de O Amor e o Ocidente não só originara, por intermédio do Centro Europeu de Cultura e da Associação Europeia dos Professores, uma campanha em prol da cidadania europeia visando essencialmente os educadores, como também suscitara a criação da Fundação Europeia da Cultura, presidida pelo luxemburguês Robert Schuman. No fundo, é a supremacia de uma ideia genesicamente europeia sobre a formação e constituição das soberanias nacionais no Velho Continente.
(16) Por unificação monetária e política entenda-se, numa palavra, a transferência acelerada de poderes nacionais para instituições do mercado comum sediadas em Bruxelas, Luxemburgo e Estrasburgo. Estas instituições são, a rigor, controladas por socialistas e internacionalistas versados em políticas keynesianas.
(17) Baseado no esquema pró-mundialista do Parlamento Europeu, foi inaugurado, em 18 de Março de 2004, o Parlamento Panafricano, em Adis Abeba, na Etiópia. Trata-se, mais particularmente, do orgão legislativo da União Africana, actualmente sedeado em Midrand, África do Sul. Entretanto, também existem outras organizações regionais com fins e objectivos idênticos, como é o caso do Parlamento Latino-Americano (Parlatino), criado a 7 de Dezembro de 1964, em Lima, no Peru, com vista a integrar os parlamentos nacionais da América Latina. Por último, têm até sido feitas algumas “recomendações”, por parte da União Europeia, para o estabelecimento de uma Assembleia Parlamentar das Nações Unidas – Ban Ki-moon, o ex-secretário da ONU, costumava referir-se à Organização como o “Parlamento da Humanidade” –, cujo fim estaria necessariamente na prossecução de soluções globais, como a paz, a segurança, a democracia, os “direitos humanos” e, last but not least, o “Estado de Direito” expressamente configurado pela nova ordem internacional.
(18) Por ideologia entenda-se, no presente contexto, a instrumentalização da cultura canalizada para a planeada organização do pensamento e do comportamento humanos. Os elementos desta instrumentalização são, em termos gerais, apresentados sob a forma de preceitos éticos e morais, direitos humanos, cidadania, democracia, diálogo-inter-religioso, paz mundial, globalização, problemas sociais e políticos, etc. Acrescidos surgem ainda outros elementos respeitantes à alimentação, vestuário, habitação, segurança, meios de transporte, bem como aos múltiplos entes, formas e substâncias da natureza. Consequentemente, a combinação destes “elementos culturais” perfazem, no fundo, a matéria-prima instrumental por via da qual professores e alunos estarão não apenas aptos a assimilar o novo modelo de gestão e organização da sociedade global, mas também a perfilharem o papel de agentes promotores da nova mentalidade ideológica extremista e radical.
(19) Cf. Ministério da Educação, Programa de Filosofia, 10º e 11º Anos, Departamento do Ensino Secundário, homologado em 22/02/2001, p. 8.
(20) Cf. Maria Antónia Abrunhosa e Miguel Leitão, Um Outro Olhar Sobre o Mundo, Disciplina de Filosofia, Edições ASA, 2006, p. 122.
(21) Oportuno seja, porém, verificar o que nos diz Daniel Estulin sobre o antropólogo americano Melville Jean Herskovits: «Em Man and His World, um manual didáctico geral publicado em 1948, Herskovits cunhou o termo “relativismo cultural” para descrever a indiferença moral e a maneira de retratar a população que caracteriza a abordagem social manipuladora da aristocracia, desde o tempo de Aristóteles. Herskovits desenvolveu a tese de que todos os padrões universais devem ser postos de lado nos estudos antropológicos das diferentes sociedades e culturas; pelo contrário, “as interpretações devem ser relativas ao contexto cultural de onde emergem”.
Esta era, claro, precisamente a mesma perspectiva da British East India Company relativamente às populações das suas colónias africanas e a mesma perspectiva que motivara a apreciação de Jefferson sobre o potencial cultural da população negra da América. Popularizado e defendido por [Margaret] Mead, o relativismo cultural tornou-se a base explícita de toda a “ciência da antropologia”.
A música desempenhou um papel-chave na formulação da doutrina do relativismo cultural de Herskovits. Em Man and His World, Herskovits sublinhava que a falta de uniformidade nas escalas musicais entre os povos primitivos era uma prova maior da sua tese, declarando, em directa oposição com o seu próprio conhecimento musical e com a história da música, que “as progressões padronizadas em que as escalas típicas e as orientações modais das convenções musicais são estabelecidas, o número de sistemas, cada um dos quais é consistente dentro dos seus próprios limites, é infinito”.
Entre 1939 e 1947, Herskovits estudou a música daquelas partes de África de onde era oriunda a maioria dos escravos americanos e delineou um conjunto de características que ele propôs provarem que a origem da música negra – jazz, gospels, espirituais, ragtime, etc. – estava nos ritos vudu. Essas características incluíam a tendência para introduzir polirrítimicos e escalas, típicos da música africana.
Estes estudos constituíram de imediato o trampolim de Herskovits para anunciar, em 1948, a doutrina do relativismo cultural em antropologia. Ao mesmo tempo, as características traçadas posteriormente por Herskovits tornaram-se a base para toda a etnomusicologia da música afro-americana e a musicologia do jazz e blues baseiam a sua perspectiva na tese de Herskovits, incluindo o princípio do rito vudu, citando-o como a sua fonte definitiva» (in O Instituto Tavistock, Publicações Europa-América, 2012, pp. 260-261).
(22) Tem até sido advogada, com base nos “mínimos morais” exigíveis a toda a humanidade do nosso tempo, a construção da “civilização mundial” proposta pelo poeta e socialista senegalês, Léopold Senghor (cf. Maria Antónia Abrunhosa e Miguel Leitão, Um Outro Olhar Sobre o Mundo, Disciplina de Filosofia, p. 125). E, assim, estamos perante o apelo para a edificação de uma civilização que se revela obra de todas as culturas e raças, não obstante a exaltação de quem, a par do poeta, dramaturgo e ideólogo Aimé Césaire, desenvolvera a bandeira da Negritude enquanto movimento político-literário oposto ao denominado impacto negativo da cultura europeia sobre a cultura africana. Igualmente vítima do socialismo, Aimé Césaire chegou mesmo a identificar a colonização europeia com o nazismo.
(23) Repare-se que, segundo este trecho, a suposta “universalidade” dos “direitos humanos”, preconizada pela ONU, não deixa lugar para que os mais variados povos, pátrias e nações possam sequer adaptar os mesmos direitos fundamentais à situação única e espiritualmente singular que os caracteriza. Por outras palavras, estamos, pura e simplesmente, perante a mais vil imposição do universal abstracto, tão caro, aliás, ao globalismo invasor.
(24) Esta Declaração, expressamente elaborada para a definição das “liberdades fundamentais” e dos “direitos humanos” constantes na Carta das Nações Unidas, começara por ser inicialmente esboçada por John Peters Humphrey e depois desenvolvida por uma comissão dos direitos humanos da ONU, de que fizeram parte, entre outros, Jacques Maritain e Eleonor Roosevelt, a esposa de FDR. Mais tarde, surgiu ainda a Carta Internacional dos Direitos do Homem, constituída pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, pelo Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais e pelo Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e seus dois Protocolos facultativos. Os dois pactos acima referidos foram adoptados pela Assembleia Geral através da sua resolução 2200 A (XXI), de 16 de Dezembro de 1966.
Inspirado no ternário da Revolução Francesa (Liberdade, Igualdade e Fraternidade), Karel Vasak, um checo de naturalidade francesa que chegou a ser director da Divisão de Direitos Humanos e Paz da UNESCO, propôs, curiosamente, uma divisão dos direitos humanos em “três gerações”, sendo a primeira constituída por direitos civis e políticos, a segunda por direitos sociais, económicos e culturais, e a terceira por “direitos de fraternidade”, por estreitamente ligados à paz, ao ambiente e à autodeterminação dos povos. A UNESCO viria, posteriormente, a estabelecer a “quarta geração” de “direitos tecnológicos”, referentes ao direito de informação e ao que, em termos académicos, se designa por biodireito.
(25) É ponto assente, na generalidade dos manuais da “Disciplina de Filosofia” o “argumento relativista” segundo o qual o conceito de “direitos humanos” representa uma forma de imperialismo do Ocidente na tentativa de universalizar as suas próprias crenças. Contudo, como veremos adiante, a questão dos “direitos humanos”, tal como estipulada originalmente pela ONU, não é uma questão compreensível sob o ponto de vista da diversidade cultural, mas sim do ponto de vista de uma arquitectura jurídica antropocêntrica, eminentemente formal e racionalmente abstractizante.
(26) A Declaração de Direitos da Virgínia, datada de 12 de Junho de 1776, precedeu a Declaração de Independência dos Estados Unidos. De nítida inspiração iluminista e contratualista, a primeira destas declarações, escrita por George Mason, proclamava, por intermédio dos «representantes do bom povo da Virgínia, reunidos em plena e livre convenção», os direitos naturais inerentes ao ser humano.
(27) O artigo 1º, que expõe a concepção subjacente à Declaração Universal dos Direitos do Homem, afirma: «todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade». E com isto, o artigo em questão define que o direito à liberdade e à igualdade consiste num direito inato que não pode ser alienado.
(28) Convém relembrar que toda a legislação pombalina também encontrara, por oposição à doutrina jusnaturalista aristotélico-escolástica, o seu fundamento no domínio racionalista do Direito Natural. É, de resto, no Compêndio Histórico do estado da Universidade de Coimbra, que se desenvolve e afirma o Direito Natural como «pura luz da Razão», de que as «Leis positivas» serão posteriormente deduzidas com vista aos «recíprocos Direitos, e Ofícios dos Soberanos, e dos Vassalos», ou aos direitos das «Nações livres, e independentes», de modo a singrar entre elas a paz e o sossego no decurso da regulação dos seus respectivos interesses, como da decisão de suas contendas.
(29) Convém observar que o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, criado em 2006, veio substituir a antiga Comissão de Direitos Humanos cujos 53 membros, na sua maioria caracterizados por um historial duvidoso na matéria, eram escolhidos longe do escrutínio público para, depois, serem finalmente eleitos por aclamação pelos respectivos grupos regionais. Sedeado em Genebra, o novo orgão foi supostamente criado para evitar as críticas que mancharam a reputação da anterior Comissão, apesar da oposição dos Estados Unidos, das Ilhas Marshall, Palau e Israel. No entanto, não obstante terem os membros do Conselho de competir entre si pelo lugar no novo orgão destinado a promover o respeito universal e a protecção dos “direitos humanos” e “liberdades fundamentais”, a verdade é que continuaram a ser eleitos, por voto secreto dos 191 membros da Assembleia Geral da ONU, países responsáveis por violações flagrantes e sistemáticas dos direitos do homem.
Ora, entre esses países contam-se a Argélia, Tunísia, Nigéria, Paquistão, Arábia Saudita, Rússia e Cuba, só para darmos alguns exemplos. A preconizada defesa dos “direitos humanos”, no caso da China, é de uma ironia macabra, visto tratar-se de uma ditadura comunista que já matou entre 60 a 100 milhões de seres humanos, fora as incontáveis vítimas produzidas pela política de aborto forçado. Junte-se a isto a extracção de orgãos de prisioneiros políticos e religiosos – como ainda de praticantes do Falun Gong –, a perseguição de cristãos e a censura da informação, para se ficar com um lindo quadro das atrocidades cometidas por um regime totalitário que não olha a meios para atingir os seus fins. No caso de Cuba, repare-se-na sua prática criminosa de perseguição brutal dos dissidentes, bem como a correlativa autocracia militar que não cessa de exportar tirania e terrorismo comunista para inúmeras partes do globo. Quanto aos demais regimes socialistas e comunistas representados no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, saliente-se os da Bolívia, Vietname, África do Sul, Equador, São Salvador e o da Venezuela de Nicolás Maduro, onde se definha e morre de fome, doença e perseguição política.
Um caso não menos emblemático, na “defesa e protecção” dos “direitos humanos” a cargo da ONU, é o da Arábia Saudita, também representada no Conselho de Direitos Humanos. Basta, aliás, ver, por um lado, como este regime islâmico decapita apóstatas, proíbe o cristianismo, decepa mãos, executa e flagela dissidentes através de cruéis e bárbaros castigos rejeitados pelo mundo civilizado, e, por outro, incita, subsidia e arma o islamismo radical. Nisto, a Arábia Saudita conseguiu ainda ver o seu nome retirado de uma lista das Nações Unidas referente ao morticínio de crianças, mesmo quando mundialmente se sabe que aquele reino islâmico continua a matar e a mutilar crianças nas escolas e hospitais do Iémen.
De resto, Jacob Zuma, o líder do regime comunista da África do Sul, tem sido apanhado na televisão, um pouco à semelhança de Nelson Mandela relativamente aos brancos, a cantar e a proclamar o genocídio de certas minorias. Entretanto, perante todos estes factos gravíssimos e altamente preocupantes, ressalta um “silêncio ensurdecedor” no seio de poderes, instituições e organizações europeias e mundiais. É a “conspiração do silêncio”, em que a defesa e protecção de direitos considerados inalienáveis são propositadamente entregues a flagrantes violadores dos mesmos, que, para o efeito, se arvoram em titulares, campeões e juízes supremos de um Conselho que mais parece evocar o caso das raposas a tomar conta do galinheiro.
(30) Cf. Luís Rodrigues, Filosofia 10.º, Consultor Científico: Álvaro Nunes, Plátano Editora, 2013, p. 95.
(31) Michel Shooyans, La face cachée de l’ONU, Paris, Ed. Sarment Fayard, 2000.
(32) Olavo de Carvalho, A Filosofia e seu Inverso, Vide Editorial, 2012, p. 257.
(33) Ibidem, pp. 222-223.
(34) Álvaro Ribeiro, «O Ideal Civilizador dos Portugueses é imensamente superior (incomparável superior) àquele que tem sido proclamado na ONU», in Diário da Manhã, ano XXXIII, n.º 11 675, Lisboa, 18 de Janeiro de 1964, pp. 3 e 6. Sobre o império cultural da sociologia, diz-nos ainda Álvaro Ribeiro: «O desenvolvimento dos estudos sociológicos, especialmente dos que são conduzidos segundo esquemas abstractos e gerais, produzidos por sábios que temerariamente se jactam de representar a universalidade, não pode deixar de chegar a provocar, por reacção inevitável, o correlato estudo das particularidades e das singularidades que se manifestam nos povos e nos homens. A uniformização sociológica da humanidade é uma utopia; poderemos imaginar que um movimento de política internacional elimine e anule, como superstições populares ou nacionais, as diferenças que restam do passado ou que se observam no presente; não é, porém, difícil conceber que novas alterações hão-de surgir, para desespero dos sociólogos, enquanto o espaço e o tempo forem meios heterogéneos e diferenciantes. O império cultural da sociologia há-de ser efémero, e depois desmembrado, para se concretizar em novas disciplinas de geografia, de história e de literatura, o que anuncia inevitável ressurgimento dos estudos filosóficos» (in Apologia e Filosofia, Guimarães Editores, 1953, pp. 89-90).
(35) É o caso do direito à vida, à liberdade e à propriedade.
(36) Cf. Os direitos concedidos por Deus estão exemplarmente consagrados e protegidos na Carta dos Direitos dos Estados Unidos (United States Bill of Rights), que é onde se encontram expostas as 10 primeiras emendas à Constituição americana. Por conseguinte, esta Carta representa o oposto do que a ONU entende por “direitos humanos e liberdades fundamentais”, visto que, segundo o artigo 29 da Declaração dos Direitos do Homem (1948), estes «não poderão ser exercidos contrariamente aos objectivos e aos princípios das Nações Unidas», pelo que assim resultam virtualmente revogáveis. De resto, a validar a perenidade de verdades auto-evidentes de que todos os homens são iguais e dotados pelo seu criador de certos direitos inalienáveis, está a Declaração de Independência dos Estados Unidos (4 de Julho de 1776), na qual se proclama que a legitimidade de todo o governo instituído consiste na protecção desses direitos – a vida, a liberdade e a busca da felicidade – e jamais na sua reformulação, interpretação ou supressão arbitrárias.
(37) Aqui incluímos a já mais que prevista quão inevitável insustentabilidade da segurança social enquanto consequência das políticas keynesianas adoptadas nos últimos 80 anos.
(38) Álvaro Ribeiro, Liceu Aristotélico, Sociedade de Expansão Cultural, 1962, pp. 196-198.
(39) Esta ideologia assenta no manifesto contra-senso de que os sexos masculino e feminino representam apenas “construções sociais e culturais” e, portanto, não encerram, para a sua respectiva determinação, nenhum dado biológico naturalmente adquirido – daí os denominados “transgéneros”, termo que designa os indivíduos cuja “identidade” não resulta do sexo biologicamente atribuído. Assim, qualquer indivíduo pode, em contexto predominantemente social, escolher e desempenhar o seu “papel de género”, ou até mesmo adoptar vários “géneros” em simultâneo, como, de resto, poderão confirmar os agitadores e activistas do movimento esquerdista internacional LGBT (lésbicas, gays, bissessuais, travestis, transexuais e transgéneros).
A escritora marxista e feminista Simone de Beauvoir deixou-nos, aliás, algumas notas que também estão na base, quase diríamos existencialista, desta “nova ideologia” destruidora da família e da sexualidade humana, nomeadamente a que considera a gravidez como “limitadora da autonomia feminina”, porque, alegadamente, “a gravidez cria laços biológicos entre as mulheres e as crianças, e por isso, cria um papel de género”. Ademais, tudo o que aqui se implica acabou por ser significativamente sintetizado pela católica e socióloga alemã Gabrielle Kuby, a saber: «A Ideologia de Género é a mais radical rebelião contra Deus que é possível: o ser humano não aceita que é criado homem e mulher, e por isso diz: “Eu decido! Esta é a minha liberdade!” — contra a experiência, contra a Natureza, contra a Razão, contra a ciência! É a perversão final do individualismo: rouba ao ser humano o que lhe resta da sua identidade, ou seja, o de ser homem ou mulher, depois de se ter perdido a fé, a família e a nação.
É uma ideologia diabólica: embora toda a gente tenha uma noção intuitiva de que se trata de uma mentira, a Ideologia de Género pode capturar o senso-comum e tornar-se numa ideologia dominante do nosso tempo».
A confusão perversa de presumíveis géneros pressuposta na não menos perversa “ideologia de género” tem, na verdade, sido progressiva e exponencialmente injectada na cabeça de crianças e adolescentes em idade escolar, produzindo, mediante a respectiva erotização, uma mentalidade acéfala e esquizóide posteriormente reflectida na vida psicológica dos adultos. É, na realidade, uma armadilha urdida em nome da “defesa das minorias” e dos “direitos humanos”, por ser especialmente destinada a “desconstruir” a relação amorosa entre o homem e a mulher, para, dessa forma, a apresentar como uma norma fortuitamente imposta a todos aqueles que já renunciaram à união genesíaca criada, perpetuada e agraciada por Deus. Entrementes, será oportuno dizer que a “ideologia de género” foi sendo introduzida, no último decénio do século XX, nas Conferências da Mulher realizadas na ONU contra a “discriminação de género” – uma expressão, aliás, vista pela Organização como “auto-evidente”, pese embora prossiga indefinível até hoje.
(40) A controvérsia à volta da morte do Papa Luciani levou a que Robert Hutchison considerasse a hipótese de que a ocultação da verdadeira causa de morte tivesse sido planeada por uma facção conservadora do Vaticano. Na base dessa ocultação estaria não só, devido à eleição do Papa Luciano, a suposta conciliação do Vaticano com o bloco comunista, mas também um afrouxamento da cidade-estado quanto ao controlo artificial da natalidade. Em paralelo, havia ainda o caso misterioso da lista dos 121 prelados maçons de que o Papa tomara conhecimento mediante o «último número da OP, o jornal dos escândalos em Roma, de Mino Pecorelli» (in Robert Hutchison, O Mundo Secreto do OPUS DEI, pp. 310-314).
(41) A expressão “direitos reprodutivos” mostra claramente como a ONU distorce e subverte a propriedade da linguagem para impor, à escala global, o planeamento familiar e, no lance, abrir as portas à contracepção e à interrupção da gravidez através do acesso legal ao aborto. Desta forma, a criança que não nasceu deixa de ser considerada como criatura de Deus, à imagem de Deus, com o seu próprio direito à vida consagrado por Deus e, portanto, subtraído a toda e qualquer arbitrariedade preconizada em nome da decisão alegadamente livre e autónoma da mulher, até porque irresponsável e subjectivamente egoísta, injusta e desumana.
(42) Cf. Robert Hutchison, O Mundo Secreto do OPUS DEI, pp.307-308.
(43) Caritas in Veritate, Carta Encíclica de S. S. Bento XVI, PAULUS, 2009, pp. 100-102.
(44) Cf. Cardeal Ratzinger, O Sal da Terra. O Cristianismo e a Igreja Católica no Limiar do Terceiro Milénio. Uma Entrevista com Peter Seewald, Multinova, 1997, p. 141.
(45) O Cardeal de Palermo, no contexto do Concílio Vaticano II, referiu-se ao termo “ecumenismo” como tendo sido introduzido na teologia pelos protestantes, e, no lance, caracterizou-o como um equívoco, «porque entendido de modo diverso por protestantes e católicos». Por outro lado, confrontado com «uma profunda reforma da atitude católica na sua relação com a verdade revelada», Mons. Corrado Mingo, arcebispo de Montréal, referira-se «à necessidade de conservar a fé íntegra, sem mutilações, porque o mal provém da recusa da verdade»: «[...] Falando claramente, restam ainda muitas e grandes dificuldades para se alcançar a unidade; por exemplo, entre irmãos protestantes, há ministros que não só negam o primado e a infalibilidade do Romano Pontífice e a presença real na Santíssima Eucaristia, como também negam outros preceitos naturais relativos ao matrimónio e não admitem a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo; e há mesmo alguns que se declaram indiferentes à existência de Deus como pessoa. Uma grande distância nos separa destes irmãos.
Mas lamento que, neste esquema, não se faça qualquer referência à Virgem Maria e à sua materna intercessão. A Mãe é sempre aquela que chama os filhos a regressarem a Casa do Pai. Maria é a Medianeira de todas as graças. Sei que muitos Padres Conciliares têm a mesma convicção relativamente a este tema. Veneráveis Padres, nós que somos membros do Corpo Místico de Cristo temos duas mães: a Igreja e a Bem-Aventurada Virgem Maria. São Cipriano, estrénuo defensor da unidade da Igreja, costumava dizer: não pode ter Deus por Pai quem não tem a Igreja por Mãe; mas nós, tendo diante dos olhos a tradição patrística e teológica e o sentir do povo cristão, tudo coisas que têm o seu fundamento na Sagrada Escritura, podemos dizer que não pode ter Deus por Pai quem não tem por Mães Maria e a Igreja. Saliento que, embora separadas, as veneráveis comunidades orientais conservam o próprio matrimónio de devoção a Maria Virgem, enquanto os irmãos protestantes perderam muita coisa porque se esqueceram da Bem-Aventurada Virgem Maria, ainda que, nos nossos tempos, alguns tenham retomado o culto da mesma Virgem. Veneráveis irmãos, o ardente desejo de Cristo, “que eles sejam um só”, não pode ser vão, porque Cristo é sempre ouvido pelo Pai; isto há-de acontecer no mundo, e há-de acontecer por intercessão de Maria; e, falando aos irmãos separados, podemos dizer, de novo com palavras de São Cipriano, “regressai à Mãe da qual partistes”. Então, haverá um só rebanho e um só pastor» (Roberto de Mattei, O Concílio Vaticano II. Uma história nunca escrita, Caminhos Romanos, 2012, pp. 303-306).
(46) Roberto de Mattei, O Concílio Vaticano II. Uma história nunca escrita, p. 255.
(47) Alighiero Tondi (1908-1984), jesuíta, abandonou a Companhia de Jesus em 1952 par aderir ao Partido Comunista. Casou-se civilmente com Carmen Zanti, dirigente comunista, e trabalhou na Alemanha comunista mas, após nova crise de consciência, na sequência da morte da mulher, em 1978, foi reintegrado no sacerdócio.
(48) Roberto de Mattei, O Concílio Vaticano II. Uma história nunca escrita, pp. 256-257. Influenciado pelas correntes progressistas da cultura francesa, em particular pela obra de Jacques Maritain, Montini tornar-se-ia, no contexto da sua aproximação ao socialismo, em nada menos do que o “Arcebispo dos operários”. Não admira, pois, que, sob o nome pontifício de Paulo VI, saudara afectuosamente, quando da sua viagem a Hong Kong, a Grande Revolução Cultural Proletária, também conhecida por Revolução Cultural Chinesa – estima-se que tenham morrido, à conta deste sofrimento sem fim, uns largos milhões de seres humanos. No mais, este Papa deu ainda respaldo ao terrorismo na África portuguesa, assim como aos partidos da esquerda na América Latina, além de considerar particularmente benevolente a Cuba socialista do “El Comandante” Fidel Castro.
Para escândalo, grande injustiça e até funda humilhação de milhões de cátolicos espalhados pelo mundo inteiro, Paulo VI nunca chegara a denunciar o martírio da Igreja na Hungria, Roménia e Checoslováquia. Posto isto, compreende-se agora que a ascensão de Montini ao pontificado tenha não apenas sido «saudada com entusiasmo pelos comunistas italianos e europeus», como também sumamente desejada pelo Kremlin, que aguardara «com preocupação a escolha do sucessor de João XXIII» (in Roberto de Mattei, O Concílio Vaticano II. Uma história nunca escrita, p. 254). Aliás, se não deixa de ser curiosa a eleição de Angelo Giuseppe Roncalli «para o sólio pontifício com o nome de João XXIII, um nome inesperado, que não era utilizado desde o longínquo ano de 1415, altura em que outro João XXIII fora deposto como antipapa», já pouco ou nada surpreende que, na «manhã do 1.º de Maio, terminado o inflamado Comício da Praça de São João de Latrão – no qual se tinha celebrado, a par da vitória eleitoral, a “festa do trabalho” -, algumas centenas de comunistas dirigiram-se à Praça de São Pedro agitando bandeiras vermelhas e erguendo os punhos fechados e, voltados para as janelas do Palácio Apostólico, gritaram: “Viva João XXIII! Viva o Papa da Paz!”».
Nisto, Roberto de Mattei passa a explicar: «Para os comunistas, o Papa João era o “Papa bom” e o Vaticano II, o “Concílio da paz”. Em 1960, o Kremlin tinha lançado a doutrina da “coexistência pacífica”, como plano estratégico para todo o período de transição, à escala mundial, do capitalismo para o socialismo. Na realidade, como afirmou Kruchshev num célebre discurso de 1 de Janeiro de 1961, em termos de conteúdo social, a política de coexistência pacífica era uma forma de intensa luta económica, política e ideológica do proletariado contra as forças agressivas do imperialismo internacional. O comunismo operava através do binómio medo-simpatia, apoiando-se na aspiração universal à paz. Assim, sem renunciar à sua acção intimidatória e ao proselitismo explícito, usava novas técnicas de persuasão implícita, através do uso de expressões como “paz”, “coexistência pacífica” e “diálogo”» (in O Concílio Vaticano II. Uma história nunca escrita, p. 250).
(49) Juan G. Atienza, A Herança dos Templários, Editorial Estampa, 2005, p. 13.
(50) Dizemos aristotélico não obstante um professor catedrático ter peremptoriamente afirmado que «Aristóteles, apesar de bastante citado, teria sido conhecido por Pais em segunda mão». Ou até mesmo que a «autoridade vale para ele muito mais do que a reflexão filosófica. Seja a autoridade da Sagrada Escritura, seja a dos Padres da Igreja, seja a dos pensadores e cronistas, seja acima de tudo a do Direito Canónico. Ou até, se quisermos precisão, a autoridade dos próprios factos». E mais adianta nos termos de uma argumentação especiosa e manifestamente difícil de aceitar por iniciados na filosofia perene: «Uma tese vale se tiver a sustentá-la a auctoritas de um canonista, como igualmente vale se apoiada num facto histórico que a comprove: por exemplo, os príncipes temporais devem obediência à Igreja porque são ungidos pelos chefes espirituais. Trata-se de um tipo de argumentação difícil de aceitar por nós, homens da contemporaneidade, mas usual nos tempos de Álvaro: o nosso Autor prova uma tese a partir de um facto decorrente dessa mesma tese» (in Álvaro Pais, Editorial Verbo, Introdução e selecção de textos de João Morais Barbosa, 1992, pp. 16 e 18-19).
(51) Em última análise, o Papa, enquanto monarca do mundo, goza da plenitudo potestatis, o que significa que reúne superiormente o poder da Igreja e o poder do Império, de modo que a ele pertencem o gládio espiritual e o gládio temporal. Contudo, tal não implica que a supremacia espiritual do Vigário de Cristo seja simplesmente alheia ao reconhecimento da espiritualização ou da marca do sobrenatural na pessoa do rei, príncipe ou imperador. Dito de outra forma, o Sumo Pontífice, não obstante delegar o uso do gládio temporal no imperador, mantém o poder de o avocar a si em qualquer altura, pois é ele, de facto, que directamente recebe a investidura suprema espiritual de Deus. Por conseguinte, a incontestabilidade do poder régio, garantida por mediação papal, não poderá ser posta em causa pelos súbditos, já que do povo e da comunidade não procede qualquer legitimidade espiritual.
Daqui podemos então concluir que o Papa não detém dois poderes distintos entendidos como duas entidades políticas diversas, mas que nele preexistem duas dimensões indistintas de um poder pleno, originário e eminentemente espiritual. Daí o primado do uno sobre o múltiplo, ou do espírito sobre a matéria, a que subjaz a independência específica do príncipe na organização secular do Império, não em sua razão originária, mas em função da multiplicidade de interesses temporais, na qual as realidades se impõem e diversificam. Logo, só quando, por via ascensional, se procede à espiritualização da acção régia mediante a unificação da diversidade temporal na ordem espiritual, é então possível compreender a tese de que os dois gládios pertencem de pleno direito à Igreja.
(52) Trata-se de um edifício situado no interior da Cidade do Vaticano, onde se encontram sedeadas a Academia Pontifícia das Ciências, a Academia Pontifícia das Ciências Sociais e a Academia Pontifícia de Santo Tomás de Aquino.
(53) Nello Scavo, Os inimigos do Papa Francisco, A Esfera dos Livros, 2017, p. 175.
(54) Idem, ibidem, pp. 177-178.
(55) Ibidem, p. 178.
(56) A “Guerra ao Terror” tem sido uma falsa bandeira originada na sequência do Projecto para o Novo Século Americano, e, como tal, agitada até às suas últimas consequências após o 11 de Setembro. Aquele projecto, não obstante a vasta especulação a que deu lugar, foi, na verdade, o ponto de partida para o que ficou conhecido como “o novo Pearl Harbor”, que contou, aliás, com a activa participação da Agência Central de Inteligência. Refira-se, a propósito, o livro de David Ray Griffin, intitulado The New Pearl Harbor: Disturbing Questions About the Bush Administration and 9/11.
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Quando é que lança outro livro?
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